sábado, maio 28, 2005

MARIZA LOURENÇO, PORQUE HOJE É O DIA DELA

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Mariza Lourenço




CREDO


creio na palavra e boa intenção alheias.

(mesmo que todos os indícios contrariem minhas crenças... creio)
creio por opção. prefiro encerrar as dúvidas em algum canto escondido
: em mim.

(mesmo que eu caia... e caio. mesmo que eu desça ladeira abaixo... e desço... creio)

creio e esta crença me faz acreditar novamente naquilo que me provoca a queda.
creio e esta crença me faz subir escadas de joelhos.

toda vez.

(creio)


Mariza Lourenço


Todos os beijos e mais um, amiga querida, pra você neste seu dia.
E nosso carinho,

Márcia e o povo do Beco, todinho.

leia mais Mariza, hoje e todos os dias aqui.


O PRIMEIRO BRASILEIRO 3



Das dunas, os índios observaram em silêncio os dois homens se afastarem. Cercado de três guerreiros e cinco mulheres, o chefe desceu as areias e encaminhou-se para o lugar onde estavam depositadas as oferendas portuguesas. Enquanto as mulheres se divertiam com o que viam e pegavam, os guerreiros, com arcos em posição de ataque, vigiavam os visitantes. O chefe fez sinal para o alto da duna e de lá desceram mais mulheres para levar os presentes. Deixaram no lugar só a esteira e subiram, todos, ao topo da duna, perdendo-se de vista, por um bom tempo, na floresta.
João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes julgou ser aquela uma atitude amistosa: os silvícolas receberam os presentes e o chefe até os havia salvo de uma tentativa de morte. À tarde, os índios voltaram a ocupar o topo da duna. Mas não desceram à praia. Como a ordem do comandante era a de que só voltassem após o contato ou em caso de perigo de vida, João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes resolveu pernoitar ali mesmo na praia. Pediu ao degredado que o ajudasse a trazer o barco para terra, e fizeram uma fogueira que os protegeria contra animais e o frio da noite. Enquanto um dormia, o outro vigiava, combinou com o degredado a quem coube o primeiro repouso.
Tão logo este pegou no sono, João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes, tudo levando - menos o barco, afastou-se do local, devagar, silenciosamente, beirando as águas que chegavam, mansas, à praia escura, a lua encoberta por nuvens pesadas a anunciar chuva.
Duzentos metros adiante, ele resolveu adentrar a mata. Sabia que os índios estariam vigiando, mas a escuridão seria amiga naquela hora. Encobriu seus apetrechos com folhas secas, subiu numa árvore, sentou em um de seus troncos e a ele amarrou-se. Os índios viram-no afastar-se da fogueira, mas nada fizeram, certos de que logo voltaria. E assim João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes perdeu-se da vista dos Potiguares.
O degredado, em seu sono pesado, sonhos de liberdade próxima, não se apercebeu, três horas depois, quando os índios dele acercaram-se e, com uma só flechada no coração, deram cabo de sua vida. Das embarcações, nada se via, a não ser o brilho da fogueira queimando na praia, denunciando a presença portuguesa em terras de Santa Cruz. Mais próximo, o medo a afugentar-lhe o sono, João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes a tudo assistiu imóvel, preso ao tronco que ali o manteria seguro caso dormisse.
Os índios carregaram o cadáver do degredado duna acima, levando, também, o barco que ficara na praia, longe das águas, a salvo da subida da maré. A indiada, intrigada com o sumiço do outro visitante, recebeu ordens do chefe para caçá-lo naquela mesma noite. Queria-o vivo, pois poderia servir de troca caso algum dos seus caísse prisioneiro daqueles homens estranhos, montados em canoas gigantes. Mas foi em vão a busca da indiada. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes havia se escondido onde os nativos, pelo menos naquela noite, não poderiam percebê-lo. O desaparecimento intrigou o chefe indígena, que irritou-se ao desconforto de noite sem sono.
Aos primeiros raios de sol da manhã, o português se desamarrou da árvore e a desceu cauteloso, os ouvidos à espreita de qualquer ruído. Ele dormira em frondoso cajueiro, àquela época sem nenhum fruto, mas apreciou sua beleza e reparou em suas folhas largas, cheirosas, um cheiro estranho que jamais experimentara. Ficaria por ali. Queria ter a certeza da partida da esquadra, dali a quatro dias, prazo combinado com o comandante Gaspar de Lemos. Teria de se acautelar contra os índios e perigos da floresta, seus animais desconhecidos, os insetos peçonhentos, as cobras. Acordou com o rosto todo picado por insetos, muriçocas e maruins que o infernizaram naquela noite. O resto do corpo, bem vestido em panos grossos, botas que lhe encobriam pés e pernas, nada padecera, a não ser o incômodo da posição, coisa de menor importância diante de problemas maiores.
A indiada amanheceu na praia, no local onde ainda permanecia, presa por pedras, a esteira deixada com as oferendas. O corpo do degredado morto servira de alimentação àqueles índios canibais, fora churrascado naquela mesma noite, numa grande fogueira, e devorado em pouco tempo, por muitos dos guerreiros da tribo. Potiassu, o chefe, comera o primeiro pedaço, certo de que assim fazendo, toda ciência daquele homem transferir-se-ia para si, como para todos que também o comessem.
Das embarcações fundeadas, os homens estranhavam o sumiço dos portugueses. A fogueira ainda queimava na beira-mar, mas sinal algum havia ali dos homens pernoitados. Nem do barco. Gaspar de Lemos julgou-os terem sido apreendidos pelos silvícolas, que já estavam às dezenas em derredor do marco, trazendo oferendas e a colocá-las na mesma esteira usada pelos enviados: frutos, animais abatidos, cocares, redes, ornamentos de penas coloridas, tacapes, arcos e flechas. O comandante estranhava aquela situação. Acreditava na captura dos seus homens pelos índios, mas julgava-os vivos. Esperaria os acontecimentos.

Eduardo Alexandre




sexta-feira, maio 27, 2005

O PRIMEIRO BRASILEIRO 2


Réplica do marco de posse da terra brasileira
no lugar onde foi chantado

As embarcações portuguesas amanheceram repletas de peixes voadores em seus conveses. Bem próximas às embarcações, duas baleias brincavam nas águas da enseada. No céu azul bem claro, nuvens de pássaros eram vistas de um lado para o outro, pássaros de todas as cores, um encantamento. Em terra, os índios, no cimo das dunas, já os aguardavam pintados de preto. Alguns pareciam dançar. O vento continuava forte, encrespando o verde das águas. Longe da praia, onde repousava o marco, dezenas de guerreiros gesticulavam, acenavam para os embarcados, como se os convidassem para o desembarque.
Gaspar de Lemos chamou seus comandantes de naus ao navio capitânia e contou de sua intenção de ir à praia, com presentes para os nativos. A tripulação, no entanto, mostrou-se temerosa, fazendo ver o risco de vida que a missão representava. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes viu aí sua grande chance de permanecer em terra. Correria o risco de ser morto pela indiada, mas não tinha medo da morte: o sonho de riqueza fazia-o cego ao perigo. Apresentou-se, então, como voluntário para a missão. Como era tripulante da nau comandada por Américo Vespúcio, este fez objeção.
— Melhor mandar degredados.
Como João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes insistia em participar da missão, Gaspar de Lemos, embevecido diante da coragem demonstrada pelo marujo, decerto a servir de exemplo ao restante dos comandados, consentiu finalmente com a ida do mancebo a terra. Mandou retirar dos porões do navio o degredado de maior pena e condenou-o à missão. Se voltasse, seria um homem livre. O degredado, no entanto, recusou-se, preferindo morte por afogamento ou qualquer outra, a ter com aqueles selvagens, quem sabe comedores de carne humana.
O próprio Gaspar de Lemos desceu aos porões da nau. Conversou com os apenados e por fim um deles concordou com a proposta do comandante. Se voltasse, seria um homem livre: acompanharia, mesmo que desarmado, o marujo de 22 anos em sua missão. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes estaria provido do que havia abordo de melhor em armamentos e apetrechos de sobrevivência, comida, munição farta, facas e facões. Era a chance que esperava. Sabia, Portugal mandaria outras esquadras àquela terra, e depois que tivesse em mãos os tesouros que com certeza encontraria, voltaria rico para uma vida confortável em Paris, onde pretendia viver.
Preparado o barco com as oferendas portuguesas, peças de tecido, roupas, chapéus, botas, panelas, espelhos, estatuetas, pentes, uma série de bugigangas, os dois lusitanos rumaram para a praia. Deviam tentar fazer contato com os nativos, não deviam ir longe, adentrar-se ao litoral, e teriam o prazo de cinco dias para a missão. Se não voltassem nesse prazo, a esquadra seguiria viagem. Gaspar de Lemos estava certo de que a missão seria bem sucedida, afinal, quando do aportamento de Cabral na viagem anterior, tinham encontrado índios pacíficos que ficaram satisfeitos com a troca de presentes e até os levaram às suas aldeias, chegando a oferecer suas mulheres à tripulação.
Quando os índios perceberam o pequeno barco dirigindo-se para a praia, voltaram ao alvoroço. Muitos correram, descendo as dunas, empunhando arcos e apontando suas flexas em direção aos portugueses. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes, nessa hora, tremeu. Viu algumas flechas caírem bem próximas à embarcação que os conduzia e chegou a remar em sentido contrário ao que se propusera. Longe do alcance das armas indígenas, deixou-se a contemplar aquele inusitado cenário. Das dunas, desceu um guerreiro forte, mais alto que os demais, com um arranjo de penas na cabeça, e comandou a volta da indiada para as dunas, como se a demonstrar querer a visita.
João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes tomou coragem e experimentou rumar para a praia. Viu quando os índios iniciaram imensa gritaria para depois dominar o silêncio, imposto pelo comando daquele que deveria ser o chefe de todos eles. Aos poucos, foi se aproximando da praia, enquanto a indiada, no alto das dunas, aguardava o desembarque em silêncio. Por um bom tempo, o mancebo português vacilou. Os índios estavam distantes, mas aquilo poderia ser uma cilada. Por fim, mais certo da reação satisfatória dos nativos, desembarcou.
Próximo ao marco chantado na véspera, sobre uma grande esteira de fibras vegetais, colocou as oferendas do seu comandante, dispondo-as cuidadosamente. Enquanto ele e o degredado companheiro de missão preparavam o local para as possíveis trocas, um dos índios, gritando, parecendo possesso, disparou em direção à praia com uma lança na mão. O índio que parecia o chefe tomou seu arco, armou-o com uma flecha e disparou contra o insubordinado, atingindo-o na coxa direita, por trás, fazendo-o cair um pouco adiante, tingindo de vermelho aquelas areias amarelo-pálidas do Novo Mundo.
Duas mulheres nativas, obedecendo ao comando do chefe indígena, vieram recolher o homem caído, acalmando os nervos dos portugueses de terra. De onde estavam, fundeados na enseada, os ocupantes da frota portuguesa nada perceberam, impedidos que estavam pela vegetação que aqui e ali coloria de verde as dunas da praia que viria a ser conhecida, séculos depois, como Praia do Marco. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes, a mão tremendo, já empunhava a garrucha de dois canos, pronto para o enfrentamento. Aliviado, continuou na tarefa das oferendas e, ao terminá-la, afastou-se duzentos metros do local, cuidando de levar consigo o barco.


Eduardo Alexandre




quinta-feira, maio 26, 2005

AREIA


Praia do Marco RN Brasil


tu és o mar
sou a areia

ou seja:

sobre mim deslizas
e eu, da orla,
te observo inteira.

Antoniel Campos


A FESTA DO LIVRO


Holmes/Watson

A União - Cultura - quarta, 25 de maio


Se tem uma coisa no mundo que eu gosto é de livro, este objeto cheio de histórias, vidas, viagens, sonhos, segredos, memórias e confissões, que é a melhor companhia que alguém pode desejar. Jorge Luís Borges diz que de todos os instrumentos que o homem inventou o livro é, sem dúvida, o mais assombroso porque os demais são extensões do corpo, como o telescópio, que é extensão do olho; o telefone, extensão da voz, o arado e a espada, extensão do braço. Mas o livro, continua Borges, é uma extensão da memória e da imaginação. E graças ao livro, digo eu, a solidão, a tristeza e o tédio são banidos do nosso cotidiano.
O livro não vai desaparecer nunca. Mídias paralelas estão surgindo, como outros tipos de suporte para a palavra escrita: livros falados, ou telas roladas em um equipamento de leitura eletrônico. Mas o livro como o conhecemos hoje, com esse formato de folhas amontoadas presas por um de seus lados em uma lombada, e que nos acompanha desde o início do século XV, vai permanecer conosco ainda por muito tempo. Vai continuar sendo levado para dentro da rede armada no quintal, conduzido na bolsa para ser lido no ônibus, desfrutado ao ar livre numa praça tranqüila ou saboreado numa noite fria enquanto nos encolhemos no canto do sofá, com uma boa xícara de café ao lado.
E quando interrompemos a leitura para desfrutar desses instantes de encantamento absolutamente pessoais e solitários que o livro determina, enquanto a nossa mente vaga ou quando, estimulados pela leitura, desenterramos na nossa memória alguma emoção, lembrança ou sentimento já esquecido, podemos apertar o livro ao peito para que o nosso coração também sinta a proximidade desse objeto mágico e com isso acumule alento para bater ainda por muito tempo.
Se você gosta de livros como eu, venha visitar a Bienal Nacional do Livro de Natal, em sua terceira edição, que ocorre agora de 3 a 12 de junho próximo, na área de eventos do Shopping Midway Mall. Uma verdadeira festa do livro, com mil e cem metros quadrados de estandes onde quarenta expositores (livreiros, editores, instituições) vão mostrar cerca de 10.000 títulos. Acontecerão também cerca de cinqüenta palestras, oficinas, seminários e encontros literários com nomes como Fernando Morais, Autran Dourado, Carlos Heitor Cony, Afonso Romano de Sant’Anna, Zuenir Ventura, Silviano Santiago, Edson Nery da Fonseca, além dos escritores locais. A Paraíba vai estar representada por José Nêumanne Pinto e Aldo Lopes. Apareçam.

Clotilde Tavares


O PRIMEIRO BRASILEIRO 1

FICÇÃO


Primeiro marco de posse de terra chantado pelos portugueses no Brasil,em Touros,hoje na Fortaleza dos Reis Magos, boca da barra do Potengi,Natal/RN.


João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes chegou à Terra de Santa Cruz em 17 de agosto de 1501, dia de São Roque, como marujo da esquadra comandada por Gaspar de Lemos. Vinha disposto a ficar naquelas terras, explorá-las, amealhar ouro e pedras preciosas e, se pudesse, voltar rico para a civilização. Era uma manhã clara, de sol forte, ventos a assobiar pelos conveses das três naus fundeadas diante daquele cabo, certamente extremo nordeste daquelas terras cuja posse vieram tomar, a mando do rei de Portugal, Dom Manuel.
Sua intenção, não dissera a ninguém, mantinha-a em segredo, na primeira oportunidade afastar-se-ia da tripulação, desertaria, sendo dado como morto ou perdido em meio àquela floresta sem fim, logo depois das dunas, fartas naquele pedaço de chão. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes estava deslumbrado diante daquele cenário primitivo, belo e misterioso, repleto de pássaros que nunca vira. O mar, límpido e verde, a proporcionar o espetáculo dos golfinhos em brincadeiras intermináveis, feito dança, acompanhando, circulando as embarcações.
João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes estava na nau comandada por Américo Vespúcio, a quem, mais tarde, foi prestada a honraria de ter seu nome ligado àquele continente, imenso continente, descoberto, anos antes, pelo navegador genovês Cristóvão Colombo, em 1492.
Os peixes voadores o encantaram. Voavam em cardumes, perseguidos por um peixe comprido, brilhante, branco, de metro e meio, calculava, que mais tarde viera a saber chamar-se camurupim, nome dado pela indiada que sabia existir, mas que não dera ainda sinal de vida.
Os silvícolas existiam, garantira o comandante que, ano antes, participara da frota de Pedro Álvares Cabral quando da confirmação da existência de terras onde supunham as encontrariam. Terras portuguesas, asseguradas pelo Tratado de Tordesilhas, que dividia o mundo desconhecido entre Portugal e Espanha, sob bênçãos do papa. Estavam ali para um primeiro reconhecimento, mapear a área e dar nome aos acidentes geográficos significantes que encontrassem no caminho, dali até Porto Seguro, onde aportara a esquadra de Cabral. Estavam próximos ao Cabo de São Roque, como mandara registrar em livro o comandante, numa enseada de mar tranqüilo, de onde estudavam o litoral. Gaspar de Lemos viera com a incumbência de fazer o chantamento de marcos de posse naquela terra, e ali deixaria, para que soubessem os que porventura se aventurassem por aqueles chãos, aquelas eram terras portuguesas.
Gaspar de Lemos temia os índios, vira-os no ano anterior, e sabia que podiam trazer perigo. Como nenhum deles foi visto, tomou a decisão de naquela mesma tarde providenciar o desembarque do monólito de legítimo mármore de Lisboa, branco fosco, onde podiam ser vistos, em relevo, a Cruz da Ordem de Cristo e as armas do rei de Portugal, cinco escudetos em cruz, mais cinco besantes – pequenos discos lisos, semelhantes a moedas, para chantamento em terras acima da praia.
A guarnição responsável pelo serviço, comandada pelo próprio Américo Vespúcio, recebeu ordens de muitos cuidados, não adentrar o litoral e regressar tão logo surgisse algum silvícola. Estava bem armada e protegida pelos canhões dos navios lusitanos. O navegador indicou o local ideal para o chantamento da peça e logo que feito o trabalho regressou com os mesmos 20 homens que o acompanharam na missão. João Antônio Cícero Sebastião José Silva Fernandes, apesar de voluntarioso, permaneceu embarcado.
Logo que chegaram à nau capitânia, recebidos para festejos por Gaspar de Lemos, os portugueses começaram a perceber a presença dos índios. Primeiro, um em correria pelas dunas, saído de detrás de arbustos, abrigando-se atrás de outros. Logo depois, um outro índio fez o mesmo percurso, e outro, e outros mais. Logo, seriam mais de duzentos, trezentos talvez, muitos, a dominar o cimo das dunas amarelas, ostentando presença maciça. Portavam arcos e carregavam lanças já conhecidas do comandante da frota lusitana. Alguns avançavam em direção à praia e depois recuavam, corriam, percebia-se alvoroço entre eles.
Duas horas depois, já quase escurecendo, cinco índios se acercaram do marco, assistidos, de longe, pelos portugueses. Pegavam na pedra, lambiam, tentavam removê-la, mas nada conseguiam: o serviço de chantamento fora muito bem feito e a pedra, montada sobre pedra maior, a servir-lhe de base e encaixe, permanecia no lugar, imóvel, resistindo à pauladas e tentativas de remoção. Em alvoroço, gritando e gesticulando muito, logo dezenas de silvícolas cercavam o indicativo de posse portuguesa sobre terras de Pindorama.
Dali por diante, a indiada não teria mais paz, sabia-o o cacique Potiassu, antevendo dias movimentados na área.
Fazia-se necessária alguma reação, mostrar aos invasores que não haveria hospitalidade.
Os nativos, então, passaram a gesticular como se chamassem os portugueses de volta à praia. Gaspar de Lemos, no entanto, preferiu aguardar o amanhecer de novo dia para a tentativa de aproximação. Afinal, além do pau-brasil, abundante em toda a extensão daquele litoral, os silvícolas poderiam ter riquezas desconhecidas dos europeus. A intenção do comandante era fazer a aproximação. No dia seguinte, levaria oferendas à praia, tentaria fazer amizade com os selvagens.


Eduardo Alexandre







terça-feira, maio 24, 2005

PETRÚQUIO

Eduardo Alexandre

Acrílica sobre madeira (detalhe)


Fatos da minha memória


Domingo, ao passar pelo Grande Ponto, me veio à memória o ano de 1965. Oh! Que maravilha! Estava com meus treze anos, saindo junto a minha mãe para irmos ao Cinema Rex. Após o cinema, íamos até o Ky Show, onde víamos paqueras e amigos.
Existia o Foto Jaecy; a Confeitaria Cisne, onde comprávamos guloseimas e reinava o garçom Américo; a Cantina do Maiorana – Casa Vesúvio; a 4.400, depois Lobrás; o Edifício Amaro Mesquita, com seus consultórios médicos, dentários e escritórios... Quem não se lembra do gastroenterologista Gilberto Wanderley, irmão do nosso querido e saudoso jornalista, crítico e apaixonado por cinema, Berilo Wanderley?
Ocilene Guedes, dentista e professor da UFRN, seu consultório se situava no Edifício Amaro Mesquita; a Farmácia Confiança; Farmácia Santo Antônio; Casa Rio; a Galeria Olímpio; a Casa Lux ou Natal-Lux, entre outras. Como lembro!
Nesses Fatos de minha memória não poderia jamais deixar de citar o Granada Bar, de Nemésio, onde gente da sociedade natalense e políticos se reuniam e saboreavam as delícias da Espanha.
O Granada Bar era próximo ao Grande Ponto. Cito algumas pessoas que o freqüentavam: Berilo e Rômulo Wanderley, Lauro Arruda, Lauro Alves de Sousa, Veríssimo de Melo, Leide Morais, Gilberto Wanderley, Jota Epifânio, Newton Navarro, Dinarte Mariz, Jair Navarro, Jurandir Navarro, Iaperi Araújo, Geraldo Melo, Aluízio Alves, Agnelo, Luís de Barros, Fernando Paiva, Moacir Maia, Grilo, Carlos Lyra, Paulo Macedo, todos iam ao Granada e depois ao Grande Ponto, para saborear um cafezinho no Café São Luís, ou para um papo legal.
Com o progresso, Nemésio mudou-se, mas o Café São Luiz ainda está bem ali, perto do Grande Ponto, onde podemos ver pessoas conhecidas, como Osório Almeida.
Pena que os anos se passaram e o ano de 1965 ficou para trás em minha memória. Hoje, o Grande Ponto cresceu e o Cinema Rex é só memória.
Mas, apesar do progresso, sempre terei o Grande Ponto com aquela cara, a cara de uma Natal acolhedora e hospitaleira.


Raquel Alves de Sousa

In, Cantões, Cocadas, Grande Ponto Djalma Maranhão,
Ed. Galeria do Povo, Natal, 2002.




domingo, maio 22, 2005

AINDA SOMOS OS MESMOS?

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Recife: tela e vitrais do Cinema São Luiz.


Era emocionante. O cinema escurecia e acendiam-se os dois imensos jarros luminosos, a cada lado da tela. Lindos, pensava então. Lindos, penso ainda agora. Como marcas de uma época. São Luiz, o mais belo de todos os cinemas. No inverno, cheirava a mofo. Culpa da umidade dessa cidade abaixo do nível do mar, diziam os mais velhos. Recife de antigamente. Recife de hoje. No inverno, tudo cheira a mofo. Um instante antes do início da sessão, a voz anunciava: ponham seus óculos. E a excitação aumentava. De papel e com lentes cor-de-burro-quando-foge, os óculos, mágicos, permitiam ver em três dimensões. Ou A bem da verdade, nem sabia ao certo o que isso significava, até ver 'as coisas' do filme passarem voando ao meu lado. Ao nosso lado. De toda a criançada aos gritos. Por outro lado, ninguém resistia à tentação de tirar, vez em quando, os óculos e espiar o filme sem eles. Como era? Juro que não lembro. Engraçado esse selecionar de lembranças. Também não lembro do filme, itself, como diriam os ingleses. Lembro da emoção, do frissom. E das mães dizendo que aqueles óculos eram uma imundície, que todos pegaríamos conjuntivite. Se eram ou se pegamos, não sei. Sei que tanto tempo depois, numa tarde de maio de 2005, ao ver a fotografia da bela Salma Rayek, de óculos 3D, no Festival de Veneza, se me abriu o frasco da memória. O perfume de infância e mofo inundou a casa. Por um instante, só por um instante, tive a impressão de ver cavaleiros voando da tela do computador para o quarto e desaparecendo. Ouvi a voz de mamãe advertindo sobre o perigo da conjuntivite. Lembrei da canção de Belchior. E fui feliz.


Márcia Maia


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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