sábado, agosto 27, 2005

HISTÓRIA CABELUDA

O PT que lutou pela ética, deve continuar sua luta.
Severino 30 dias!
Léo Sodré



O maior enigma da atual crise política, a localização de milhares de fios de cabelo do publicitário Marcos Valério, está longe de ser decifrado pelas CPIs. O assunto é uma espécie de tabu e nem mesmo os piores adversários do Partido dos Trabalhadores (PT) ousam abordá-lo, temendo repercussões trágicas. Lulla, segundo fontes do Planalto, pretendia revelar, durante o último encontro de cúpula do governo, o segredo da calvície do marketeiro, mas desistiu, limitando-se a pedir desculpa ao povo e a afirmar que presidente, como reza a lenda, é quase sempre o último a saber.

O ex-deputado federal Waldemar Costa Neto, comandante-em-chefe do PL, confessa haver recebido um pequeno tufo contendo algo em torno de 10 milhões de fios para implante e afirma que Lulla sabia tudo, desde o tempo em que Valério caminhava pelas ruas de Belo Horizonte ostentando uma crina vastíssima. Waldemar, que após a renúncia resolveu sacudir a lama do próprio corpo, ainda não apresentou provas. Sabe-se, contudo, graças a criptogramas de Fernanda Karina Sommagio recém-decifrados por peritos da Interpol, que o careca nasceu com idéias cabeludas.

Os cachos de Valério, cujas qualidades naturais foram realçadas por um xampu especial feito à base de mamão transgênico suíço e abacate hidropônica chinesa, tornaram-se valiosos e disputados no mundo inteiro. Ele resistiu à primeira oferta, não desejava vender parte de seu tesouro a Steven Spielberg, para uma montagem pós-modernista de Rapunzel, dos irmãos Grimm, pois considera os contos de fada alienantes. Recusou-se, ainda, a subsidiar perucas para os metaleiros do Kiss, convicto de que os pêlos que Deus lhe dera deveriam ser usados em prol da humanidade.

No início do Terceiro Milênio, quando a estrela brilhou anunciando a queda do império tucano, o bom rapaz percebeu que chegara o tempo de contribuir com as mudanças. Procurou então os três reis magos - Genuíno, Delúbio e Silvinho - que, orientados por Deus em pele de Dirceu, propuseram ao samaritano a doação da juba milionária ao Fome Zero, sugestão prontamente atendida. Valério submeteu-se à tosa e, ao contrário do que muitos imaginavam, ficou alegre com o resultado, pois, além da caridade, conquistara uma careca parecida com a de seu ídolo, são PC Farias.

O publicitário jamais pensou em compensações pelo gesto de altruísmo, pediu apenas para acompanhar a distribuição de seus fios de cabelo com os pobres e que as operações fossem intermediadas por instituições filantrópicas. Daí, a entrada do BMG, do Banco Rural, do Banco do Brasil e do Bank of Boston na história. Conforme relatam testemunhas, os olhos do marketeiro brilhavam a cada milhão entregue a assessores parlamentares, tesoureiros de partidos e deputados carentes, afinal, o fortalecimento dessas camadas é necessário ao sucesso dos programas beneficentes.

Tudo caminhava bem até um tal Rouberto detonar o esquema, com inveja por haver concluído que é dos carecas que elas gostam mais. Não antes, como se sabe, de receber quatro milhões em títulos capilares ao portador. Para complicar, uma quadrilha misteriosa furtou o restante dos pêlos da caridade, transportando-os em cuecas, malas e barbas postiças até uma agência bancária das Bahamas. Ao descobrir o esquema, Valério reagiu: "Que é isso, companheiro!". Agora, o coitado tenta recuperar as madeixas, embora esteja careca de saber que o cabelo desviado está perdido.

Cid Augusto


CARO LAÉLIO

Léo Sodré



Caro Laélio,

estava em viagem. Cheguei na noite de ontem. De onde estava não escutei sons de arenga. Imagine que somente hoje ouvi falar nas denúncias do Buratti ao Palocci.De qualquer sorte, sou forçado a reconhecer, arenga é sempre arenga. Em briga, já dizia minha avó, cada contendor leva dois sacos. Um para dar; outro para apanhar. E eu, sendo um pacifista, me ponho a recolher os sacos da pancadaria deixados ao redor da arena. Veja, por exemplo, meu poeta, ter você usado contra a Dra. Clotilde (a quem não lembro de conhecer em pessoa) um argumento esopiano. O irmão da doutora sendo reconhecido como eminente poeta pornográfico. Você pegou pesado, dessa vez, por trazer à rinha galos de terreiros estranhos. Você, filho do doce e como que romântico, quase bucólico, autor da serenata do pescador, que se esmera no gerar versos fesceninos. O problema não é dessa ordem. O problema é de ordem libertária. Melhor dizendo: cada um escreve o que quer e publica no espaço que encontrar disponível. E você encontrou a Alma do Beco para lhe servir de meio. No outro lado da rua, cada um lê o que quer, desde que a leitura se torne possível. Explico: Não leio os textos da Dra. Clotilde, publicados na edição domingueira de um jornal local. Qual a razão? São maus os textos em causa, do ponto de vista de conteúdo, correção gramatical, estilo? Não são. Digo isso por ouvir dizer. Não os leio, simplesmente. Sem razão. Ausência de empatia com a autora, talvez. Nem por isso vou reclamar ao editor, solicitando sua retirada da pauta. Mesmo não gostando que me pautem as leituras. Leio o que quero, quando quero, venha de quem vier, no dizer do Lula. Leio você, por exemplo. Leio as glosas que você faz para os motes que lhe envio (a do bode de Mossoró, por exemplo, estava ótima). Nem por isso me sinto traidor. Ou traído. Menos ainda chulo. E, olhe, não gosto de pornografia. Por nada, não. Simplesmente não gosto. Mas acontece de também não gostar de tantas coisas. Não gosto de Zagalo e de Lula, mesmo assim sou obrigado a engolí-los.
Besteira esse negócio de reuniões, caro poeta. Leve isso a sério, não. Fique onde está. Quem não quiser lhe ler, não lhe leia. E ponto. Não tem que dar satisfação pelos seus escritos. Nem tem que satisfazer a quem quer que seja. Fazer versos não é elaborar manifesto dirigido a um público determinado. Ou seja: fazer versos não é se dirigir a qualquer público. O público é quem procura o poeta. E se dá por feliz (ou infeliz) quando o encontra. É bem o caso. A Dra. Clotilde lhe procurou. Encontrou (tendo recebido, ou não, por spam os seus versos) textos de sua lavra. Andou lendo as loas "fesceninas" de sua produção (nem sei se poeta produz, preferindo dizer que ele gera). E se deu por infeliz. Remédio: não ler mais o que você escreve.
Leitor, meu poeta, não é crítico literário, daqueles que ganham a vida fazendo comentário para jornal ou revista. Leitor é o cara que experimenta um gozo estético quando lê. Se o gozo não vem (Vige! Até parece que estou escrevendo um poema erótico), ele fecha o livro, deleta o arquivo, joga fora a revista e vai.
Por último, uma pergunta: qual é a sua? Já o vi mais briguento. Renunciar? Olhe que nem Zé Dirceu admitiu fazê-lo. Sair, somente se lhe expulsarem. Ou já lhe expulsaram? Pelo amor de Deus, me diga. É quando passarei a me tornar incrédulo. Apostatarei de minha fé no Beco e na sua alma.
Com um pedido de fique (marque o dia do fico, que eu vou lá no bar que o Beco tem por da moda, brindar - água na nossa taça - com Bob Motta. E com você, naturalmente, cuja taça é cheia de outro líquido).

Taumaturgo Rocha


Cavalheiro Taumaturgo
faz jus, sempre, ao próprio nome


Daqui, do modesto burgo,
na minha tosca Fescênia,
saúdo, lhe mando vênia,
Cavalheiro Taumaturgo !
Eu vou tentar, ver se expurgo,
me esforçar, ver se me some
das glosas o tal renome...
- Quanto a você, meu prezado,
posso dizer: - Obrigado,
faz jus, sempre, ao próprio nome !

Laélio/2005


Mote
Marque seu dia do fico,
Que eu também quero brindar


Glosa

Eu não sou contra ninguém,
de todos, sou a favor.
Cultuo a paz e o amor,
sem mais, talvez ou porém.
Laélio, se acaso alguém,
vier a nos maltratar,
é Divino perdoar,
relevar qualquer fuxico,
Marque seu dia do fico,
Que eu também quero brindar

Bob Motta


OLHAR FACEIRO

Léo Sodré



Ai, ai, meu Deus, que saudade,
da moça formosa e bela.
De uma imagem deslumbrante,
digna de uma aquarela.
De sorriso e olhar faceiro,
debruçada o dia inteiro,
no batente da janela...

Bob Motta


Carta ao poeta Geraldo Amâncio,
apresentador do programa A sanfona e a Viola, da TV Diário, Ceará


Seu Geraldo, eu tô sintindo,
umas dô no mêi duis peito,
e acho qui vô prá faca,
num tem jeito qui dê jeito.
O poeta véi s'axtreve,
a pidí qui Deus num leve,
eu agora, assim, de êito.

O dotô dixe qui a coisa,
num tá munto boa não.
Tô c'umas vêia intupida,
precisando inteivenção.
Mais eu acho é qui o dotô,
só incronta verso e amô,
dento do meu coração.

Vai uví no istetoscópo,
um vaquêro aboiadô,
a batida de um zabumba,
e um bom fole gemedô.
Um papagái inxirido,
e o rincho forte e atrevido,
de um jegue reprodutô.

O munitô vai amostrá,
fora ais vêia incalacrada,
de gurdura, uma cantoria,
e um pátio de vaquejada.
A sangria de um açude,
e eu, o poeta rude,
nuis braço da minha amada.

Ispero qui Deus vendo isso,
uvindo a minha oração,
peimita, intonce qui eu tenha,
minha recuperação.
Inda tenho amô prá dá,
munto verso prá ispaiá,
do Litorá p'ro Sertão.

Se causo dé tudo certo,
cuma ispero acuntecê,
cum ais bênção de Jesus,
é bem fativo qui dê.
E esse poema festivo,
quero decramá ao vio,
aí, meu fíi, mais você.

Mais se causo o qui eu num quero,
de repente acuntecê,
se pru vontade Divina,
o véíin disaparicê,
num vá chorá, seja forte;
no dia da minha morte,
é qui eu cumeço a vivê.

E você pode dizê,
para o mundo, meu irmão:
Vô, mais levo no meu peito,
ais coisa do meu povão.
O qui aprindí, de verdade,
na grande universidade,
dais caatinga do sertão...

Bob Motta




Grande mestre Bob Mota
Num tenha medo não
Pois, vai dar tudo certo
Nessa sua operação
Tenha munta fé em Deus
Que Ele nunca faia não

É pra ficar mais mió
Que na faca vai entrar
Vai vortá um garoto
Cum coração a palpitar
E todos os seus amigos
Vão poder lhe festejar

Porque a poesia precisa
Dos seus versos e sua mente
Que pra nós é um previlégio
Você é gente da gente
Vá e vorte logo
E venha bem mais contente

Manoel Bomfim


O CORTEJO FINAL

Léo Sodré
Helmut

Eu poderia dizer que moro sozinho na velha mansão, mas talvez isto não seja inteiramente verdade. Depois da morte bizarra de meus pais, quando eu tinha dez anos de idade, as visitas pararam. Os amigos se foram. Digo bizarro porque morreram asfixiados enquanto dormiam. Eles tinham apenas trinta anos de idade. Jovens. Ò, muito jovens. Não me perguntem detalhes. Prefiro não lembrar da cena. Mas lembro bem do nosso convívio aqui na casa. Na maioria das vezes era agradável. Havia, entretanto, ocasiões onde eu ouvia meus pais discutirem sobre certa mulher. Pensei que as conversas envolviam uma amante ou coisa parecida. Lembro também do medo que eu sentia, quando ouvia minha mãe ameaçar que queria sair da mansão. Que queria se livrar da tal mulher. A verdade é que nunca falaram sobre esses assuntos na minha frente. Eram discretos, e por isso achei que queriam me poupar do trauma que uma separação poderia causar.

Ainda moro na mesma casa. A mansão é de 1903 e, surpreendentemente, ainda detém o charme dos velhos casarões. Principalmente se vista de uma certa distância. Desde criança sempre fui apaixonado pelo lugar. Embora de alguns anos para cá, uma inquietação inexplicável vem tomando conta de mim.

Meu isolamento talvez esteja contribuindo para a agonia que sinto a cada dia. Talvez seja meu inconsciente querendo pregar uma peça, ou causar um desgoverno dos instintos que me mantêm equilibrado. Tenho a idade dos meus pais quando eles morreram. A segurança que eu sentia aqui na mansão quando criança, foi trocada por uma tortura mental e por visões que, se não for loucura, comprovam que junto comigo, outro ser habita as dependências da mansão.

Vultos parecem me seguir onde quer que eu esteja. Mesmo neste momento, em que procuro escrever para distrair minha mente, sinto a presença de alguém a me observar. A temperatura do quarto mudou e o ar está mais pesado, abafado, digamos assim.

Prefiro saber quem é, e o que quer. Não agüento mais viver com este ser, que pela sua própria ausência, insiste em desolar o que ainda resta da minha sanidade. Não! Isso não! Basta dos ruídos, e dos gritos que me tiram o sono da madrugada.

Planejei um jantar diferente das outras noites. Um jantar para dois.

Sentei-me à mesa onde, encoberto pela fraca iluminação produzida pelas velas, esperei pacientemente. Servi os dois pratos. Pus vinho nas duas taças, e esperei. Observei cuidadosamente ao redor da sala. Minha sombra era projetada contra a parede. Ponderei se a loucura finalmente havia me dominado.

Sem prenúncio, as chamas das velas que iluminavam a sala, fraquejaram inquietas. Um bálsamo diferente surgiu do nada. Senti o ar pesar, e um frio estranho se estabelecer próximo a mim. Nesse momento outra sombra refletiu contra parede, e a imagem de uma mulher, sentada ao meu lado, formou-se nitidamente. Imediatamente lembrei dos meus pais e da mulher da qual tanto falavam. Teria sido ela a responsável pela morte deles? Pensei. Começamos a jantar em completo silêncio. Ilusão ou realidade? Isso pouco me preocupava. Eu estava lutando pela minha sanidade e, quem sabe, este seria o cortejo final.

Charles Phelan




sexta-feira, agosto 26, 2005

UMA LEBRÉIA CHAMADA BRASIL

Petróleo
MANCHETE irada
do Diário de Natal de hoje

VENEZUELA JÁ QUER MARCAR
DATA PARA REFINARIA EM PE



Ilustração: Léo Sodré



Num sô besta não, eu sô é ôimbus.


Desgarrado da roleta dessa lotação sem rumo e sem prumo, sortando bufa pro mundo feito Lulinha e acoitado nas foiages do chá-de-sumiço, qui nem Genuíno e Zé Dirceu, enfinco de novo a venta nos ares e sinto qui a crasse política “desse país” arresorveu obrá tudim duma carrada só e atrás da merma bananeira prantada na fazenda de Delúbio.

Enrolados com a bandeira brasileira, cada um querendo sê as pregas de Quelé e priquito lavado com sabonete dorli, ficam todos bancando a menina bundeira e dizendo pros pais qui ainda tem cabaço. Pia!

E agora, motorista?

Cagaram dentro do õimbus e já num carece nem de abrir as janelas, apois o futum tá comeno solto no meio do mundo. O jeito é tocá essa marinete direto pra garage, lavá e desinfetá todos os assentos, sem esquecê a buléia do condutô, além do banco do cobradô – o lugá mais catinguento – apois é onde fica a bufunfa do apurado.

Adispois a gente pinta a lataria, troca a cor dos bancos e num precisa nem mudá de chofé e cobradô... pronto. Basta encostá nas paradas de novo qui os abestaiados vão tudim entrá de ruma pra mode fazê a merma linha. Tudo ficará como trasontonte, feito PSDB e PT, engatados qui nem pica de cachorro no cachimbo da cadela.

O fiscá vai continuá comendo toco do mermo jeito; em cada terminal nós vamu continuá dando nó cego; passageiro liso continua a pulá catraca e menino sambudo passando por baixo da borboleta. Sem contá as raparigas do motorista e as minhas...essas sempre vão andá de graça e num tem patrão e guverno qui tome conta e dê jeito.

Quanto a estudantada, agora num tem mais pobrema. Tá mansinha e chapa-branca qui só. Parece inté um bando de capão choco. Já a "Cutaiada" tomém virou pelega e come-quéta. Os Sem-Terras num tão nem aí pra mode invadir a fazenda de Delúbio, qui nem faziam com o FHC, tão ligado? A campãeirada vai ficá mermo ocupando a moita inté mudá de novo o rumo da lotação. Se hoje sou ‘’Rocas-Quintas’’, amenhã, quem sabe, eu faça a nova linha da ponte qui vai ligá a Rampa à praia da Redinha. Isso se Migué Cabrobó num ganhá a porra da inleição e arresorva fazê a ponte Natal - Fernando de Noronha...pra mim, entonces, vai dá certim qui só boca de bode, apois vou ficá qui nem Inaço, pra riba e pra baixo. De Pernambuco falando para o mundo, esse menino!

Agora, pense num nêgo importante. Vô saí inté na coluna sociá da baixinha Eliana e no brógui de Dunga, a “Alma do Beco”, qui nem o fio do poeta Otonié, a irmã do Bráulio e a poetisa pernambucana, chará da fia da guvernadora do Errigenê.

Quano acabá, seu Clark Quente qui me pague um troco decente na picica desse Sanatóro e qui dê, pelo menos, pra mode tumá um caldo de cana gelado com pão peito-de-moça lá no quiosque de Aldenora, visse?

Acharo ruim?

Entonces vão vê se Genuíno e Zé Dirceu tão lá no Beco da Lama conversano goma, fazeno trova e falando da vida alheia, visse?

Por isso mermo estou ouvindo aquela musga do Chico Science e nação zumbi:

- ‘’Da lama ao caos, do caos à lama. Um homem roubado nunca se engana’’


Rocas Quintas


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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