terça-feira, fevereiro 08, 2005

Feijoada turca

Edgar Allan Pôla

Dani Danada

Pedro Abech, proprietário de famoso pub da Gonçalves Ledo, ganhou, da prefeitura de Rio do Fogo, na praia de Zumbi, um terreno para construir sua casa de veraneio. A prefeitura dá o terreno, mas exige que, em seis meses, pelo menos o baldrame esteja construído.

Época de vacas magras, Pedrinho recebe a sugestão de fazer um "entre amigos" para levantar a grana do baldrame, R$ 500,00, segundo pedreiro da região praieira.

Ele vai à cozinha, conversa com a mulher, Dona Ivone, e chega com a notícia:

- Sábado, vamos ter uma feijoada, com som ao vivo e sorteio de 24 latas de cerveja! Cinco reais a senha!

- Mas Pedrinho, como é que vai ser essa feijoada? Vai ter pé de porco, orelha de porco, charque, carne de sol, livro, paio, laranja, couve cortadinha? Pergunta o jornalista Luciano de Almeida.

- Claro, responde o turco, eufórico. Vai ter tudo isso e muito mais: vocês não perdem por esperar!

Na Sexta à noite, apesar da fumaça do fogareiro a carvão que tomava conta de todo o espaço, não deixando ninguém respirar, o cheiro do feijão, vez por outra, chegava às narinas dos freqüentadores.

Com raras senhas na mão, Pedrinho comenta:

- Já vendi sessenta senhas. Até a deputada Fátima Bezerra comprou. Fátima, os vereadores Hugo Manso, George Câmara, e até Fernando Mineiro, que não é dado a esses eventos. Vai ser um acontecimento político essa feijoada! Comemora.

Dos primeiros a chegar, Luciano de Almeida toma mesa estratégica defronte ao ventilador turbinado da casa, e espera a chegada de companhia ao lado do seu Domec em taça especial.

No Beco da Lama, não se falava em outra coisa, todos despedindo-se de todos para um pulinho ao Bar do Pedrinho, para a degustação da já famosa feijoada. No Bar de Nazi, Zacarias Anselmo, da CUT, pede para que Gardênia traga a feijoada ao bar. Faz uma cota, passa dez reais para Gardênia, e espera chegar o produto do desejo coletivo.

Quando chega a quentinha com um pouquinho de arroz, um pouquinho de farinha e uma concha de feijão estrategicamente jogada no fundo do invólucro, a turma entreolha-se espantada.

- É isso a feijoada de Pedrinho? Sem carne alguma? Esse tiquinho? Essa picardia toda? A gente devia ter pedido era a feijoada de Neide!

Aperreado, morto de vergonha por ter sugerido a feijoada de Pedrinho, Zaca vai a Neide e compra a feijoada de 3 reais, do jeito que é servida no dia-a-dia.

- Uma única feijoada de Neide vale por 3 dessas de Pedrinho, comenta Dedé, o tesoureiro da Sociedade dos Amigos do Beco.

Em Odete, o cronista do cotidiano do Beco, Caubi, desce o pau na feijoada.

- Uma picardia de fazer gosto. Vocês precisam ver. Carne? Só se diluída no cozimento! Uma vergonha real de cinco contos de réis.

Em Pedrinho, chegam Fátima Bezerra e Geraldão, então pré-candidato a governador do Estado pelo PT, e começam conversa com Luciano de Almeida. Discutem assuntos do partido, da proibição de Dom Alair Villar à candidatura de Padre Fábio pelo partido, enquanto tomam aperitivos esperando o apetite chegar.

Quando a deputada pede a feijoada e vê chegar aquela baixelazinha, pequenina e rasa ña qual Pedrinho serve sua tábua de frios, envergonhada, ela pergunta:

- É essa mesmo, a feijoada de Pedrinho, Luciano? Experimenta, demora mais um pouco e se despede da turma, deixando o gordo Geraldão, do alto dos seus 160 quilos, em dúvida se compra ou não a senha da feijoada de Pedrinho.

Com medo da fome, ele toma providência:

- Pedrinho, me dê cinco dessas senhas! Mas, antes, me traga alguns copos de caldo aqui para mim e para o companheiro Luciano.

As pessoas vão chegando e a decepção toma conta do bar. Decepção que logo se transforma em galhofa e motivo de muito humor.

Uns chamam Ivone e trocam suas senhas compradas de véspera por cerveja. Outros, se mandam, dizendo ser melhor passar fome noutro lugar, o bar esvaziando-se e só conseguindo público cativo lá pelas 5 da tarde, quando o volume do som foi aumentado para que se ouvisse o especial da Rádio Universitária, com Terezinha de Jesus.

A picardia do turco chegara ao limite: não teve música ao vivo; Pedrinho não queria sortear as cervejas; para conseguir dois pedacinhos de carne no seu prato, Geraldão teve de ameaçar chamar a polícia; outros nem ameaçando com Procon, a nada mais tiveram direito; e, isso, diante de todos os comerciantes de bares e similares da vizinhança, que haviam comparecido para prestigiar o turco amigo.

Em todos os botecos da cidade, o assunto rendeu o resto do dia; todo o Domingo, e, na Segunda-feira, ainda era a feijoada turca de Pedro Abech que estava nos comentários de todos.

Na terça-feira seguinte, reconhecendo que tinha exagerado, Abech se sai com essa:

- Ora, eu não disse a ninguém que ia ter uma carnada. Disse que era feijoada. E feijão teve, ora se não!

Com a continuação dos protestos, ele, entre amigos, ainda tentou remendar:

- Sábado próximo, eu reuno a diretoria e dou uma feijoada grátis para todo mundo.

Paparazzi, que ouvia a conversa ao lado de sua Inês, comentou:

- Se a de cinco reais foi o que foi, a de grátis deve ter apenas um caroço no prato, acompanhado de palito. Venho não!

por Alma do Beco | 6:36 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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