quarta-feira, setembro 21, 2005

VAMOS CHAMAR O BOBO

Marcus Ottoni


“No mesmo dia em que Lula não votou porque não votou, 272 mil petistas votaram porque votaram. Lula poderia ter dito qualquer coisa, menos fazer gracinha com um partido que está na lona muito mais por sua causa do que por culpa da militância anônima da estrelinha.” Elio Gaspari



Tengo Telengo Tengo

Tão pecador
Comunga
Com cavaco-chinês

Plínio Sanderson




Vamos chamar o Bobo

Vamos culpar o bobo,
Por essa tremenda zoada,
Na porta desse lugar
Onde todos têm entrada

Vamos brindar ao bobo
Que assim meio cabreiro
Diz-se apenas passageiro
Mas tem alma de arteiro

Vamos agradecer ao bobo
Que é pura gentileza
Abrindo espaço e ouvidos
Emocionando toda a redondeza

Rápido, vamos chamar o bobo
Calma aí, se aquiete, se acalme
Ele vem e desaparece
Quem o viu, jamais esquece

Deborah Milgram




De volta à Solidão

Depois de tanto tempo,
Eles voltaram
Aos ares
Árvores
Fios elétricos
Muros, telhados.

Cantam,
Trazendo uma alegria
Há muito ida,
Quando os canarinhos da terra,
Alaranjados,
Queimados de sol,
Se foram também.

São belos,
São mágicos:
Tricolores como a cobra coral
Que ainda resiste,
Sob as folhas caídas
Dos cajueiros teimosos
Das dunas
Do Tirol.

Entre os pardais invasores,
Aqui chegados nos anos 70
Do século passado,
Galos-de-campina nos lembram
O tempo,
Quando esses matos eram chamados
Solidão.

Eduardo Alexandre



A gente recebe bem

Bob Motta lhe garante:
A gente recebe bem,
não quer saber quem é quem,
todo e qualquer visitante.
É carinho a todo instante,
na capital potiguar.
A lhes recepcionar,
golfinhos desinibidos,
nadam e pulam divertidos,
na piscina azul do mar...

Em noite de lua cheia,
eu vou pra beira da praia,
me sento numa "catráia",
e ouço o canto da sereia.
O esguicho da baleia,
faz eu me emocionar.
E fico a me imaginar,
dentro d'água, sem pudor,
com você, fazendo amor,
na piscina azul do mar...

Bob Motta



Versos de solidariedade

Bob Mota, meu prezado
Tô cum você e não abro
No seu verso bem rimado
Contra esse descalabro

É de lascar essa verdade
Por você apresentada
É muito grande a maldade
Cum a poesia amatutada

Eu também já notei isso
Que o cordel nunca ganhou
Parece que o compromisso
É só com o verso do "dotô"

Nós também somos "dotô"
Na arte de escrevê
Pois falamos de amô
De sodade e de sofrê

De paisage do sertão
Do forte cabra da peste
Aquele nosso irmão
Que tem in todo nordeste

Cum você sou solidário
Aproveitando sua poesia
Você não está solitário
Pois tem minha simpatia

Manoel Bomfim



Péricles

Já faz algum tempo, apareceu pela Igreja Matriz da Cidade da Esperança, Péricles, um jovem trajado de imundos calção e camiseta, descalço, de rosto amarelado, os olhos avermelhados e perdidos, cabelo e barba em desalinho e com um penetrante fedor de cola e suor, de sujeira e lágrimas.

A primeira vez que entrou na Igreja, era dia de domingo, na Missa das 19:00 horas. Como de costume, a Igreja estava lotada até o tampo. Desde o altar, inquieto, observei o jovem mendigo abrindo passo pelos corredores, imprensado pelo povo, de mão estendida, pedindo esmola.

Não era a primeira vez que algum pedinte, de aspecto parecido, procedia assim. As pessoas, incomodadas, retrocediam ou faziam de conta que não viam... Algum raro paroquiano metia a mão no bolso para dar algum trocado.

Dentre todos aqueles que andaram pela Igreja, só Péricles permaneceu até hoje, nos proporcionando sua incômoda visita alguns dias durante a semana e, invariavelmente, nas Missas dos domingos. Às vezes, parece ficar satisfeito com uma ou duas voltas pela Igreja. Outras, passa uns dez ou quinze minutos rodando pelos corredores, inquietando as pessoas, atrapalhando as orações, a liturgia, a pregação, etc.

No começo, algumas pessoas me pediam: “Padre, não sei como o senhor consente... Deveria botá-lo para fora.” Mas eu nunca expulsei (e se Deus me der juízo, não expulsarei) ninguém, nunca, por motivo nenhum.

O Dr. José Dantas, da Vara da Infância e da Adolescência, cuja amizade prezo por muitos anos, me confidenciou que Péricles havia sido criança abandonada na creche e passou a primeira juventude esperando uma adoção que nunca chegou. Já adulto, ganhou às ruas e por lá ficou.

Há uma categoria sociológica para a pirâmide social humana que qualifica como “descartáveis” as pessoas que se situam no último estrato social. A palavra “descartável” parece forte demais. Mas sociologia é assim mesmo. Por exemplo, apenas na África subsahariana, neste ano que transcorre, há quase oito milhões de pessoas que morreram ou que vão morrer de malária, AIDS e fome. Não são apenas hipoteticamente “descartáveis”, mas estão sendo, simplesmente, “descartados”.

Desde o primeiro momento, percebi que Péricles era um “descartável” ou, como se dizia antigamente, “bucha de canhão”. A cola ou a droga e a impossibilidade de adaptação ao meio, fizeram-no assim. Em algum momento, imaginei que poderia enviar Péricles para a Fazenda Esperança, na Serra do Mel, para tentar sua reabilitação, como já fizemos com outros jovens. Destes, um que não agüentou e voltou, já foi assassinado. Estes têm família que se preocupam com eles. Péricles, não: pertence, somente, à rua e a Deus.
Parece ser que, apenas na Igreja, se sente seguro ou protegido. Dias atrás, colou-se, sufocado, na sacristia, rogando-nos para deixá-lo sair pela porta traseira da casa paroquial que dá para a avenida Pernambuco, pois, na praça da frente, havia gente que queria matá-lo. Por quê? Não saberia dizer, pois ele não contou, mas podemos pensar que seria qualquer coisa relacionada a dívidas por drogas. Escapou, assim, Péricles, da morte anunciada e, por alguns dias, não o vimos mais. Porém, não custou muito em aparecer de novo e continuar atrapalhando e incomodando, como de costume.

Algumas pessoas mais perspicazes em sua fé começaram a compreender o porquê eu deixava perambular Péricles, sem me importar. No fim, eu não teria coragem de me aproximar do altar do Senhor para celebrar na Eucaristia, a comunhão no seu Corpo e no seu Sangue dados por toda a humanidade, se eu tivesse a ousadia de expulsar Péricles. Para que serviria uma bela liturgia que excluiria um jovem, classificado pela sociologia de “descartável”?

Lembro, aqui e acolá, a palavra de São Paulo, precisamente, para aqueles que fazem a divisão social tanto na vida quanto na Eucaristia de que, aquele que come do pão e do vinho consagrados, “sem dar seu devido valor, se torna réu do Corpo e do Sangue do Senhor e come e bebe sua própria condenação”. Porque a Eucaristia é, por definição, o grande instrumento de comunhão humana e divina. E, assim, está sendo compreendido por algumas boas pessoas da paróquia. No fim, o próprio Jesus se tornou um descartável e, conseqüentemente, um descartado.

De todo modo, é arriscado dar dinheiro a Péricles, que, com toda certeza, vai para a droga que for (não saberia dizer qual). Mas um prato de comida não falta numa ou outra casa da Paróquia.

Domingo passado, Péricles completou 23 anos. Apareceu na Igreja bem cedo para me comunicar seu aniversário. Na sacristia, antes da Missa das 8:30h da manhã, já havia passado pelo meu gabinete onde me abraçou e beijou na careca. Um penetrante fedor repentino me deixou meio tonto. Roguei-lhe que, para a Missa da noite, viesse limpinho, arrumado e cheirosinho.

Na Missa da noite, Péricles, sentado num banco lateral, perto do presbitério, com a cabeça apoiada no encosto do banco da frente, dormitando em sua própria imundície, participou de toda a Missa. Antes da benção final, pedi a toda a Igreja, como temos o costume de fazer com os aniversariantes do dia, para cantar os “parabéns pra você”. Péricles, tentando sorrir, apesar do aspecto maltrapilho, sujo e sonolento, conseguiu ficar de pé. Após a benção final, dei o costumeiro abraço em Péricles, do mesmo jeito que em outros. Depois, na sacristia, a secretária da paróquia deu a ele, de presente, um relógio barato, comprado num camelô.

Pensei que o relógio se tornaria fumaça rapidamente. Porque só um milagre de primeira grandeza salvaria meu amigo Péricles de ser, apenas, um ser humano sociologicamente “descartável”.

Pe. Agustín Juan Calatayud y Salom sj




Carnaval em tempos de guerra

Hoje, 21 de setembro, a Livraria Sparta promoverá, dentro do projeto “Prosas e Pensamentos”, a palestra “Carnaval em tempos de guerra em Natal” proferida pela professora Flávia de Sá Pedreira. O evento reunirá escritores, artistas e pesquisadores da cultura regional. A proposta da livraria é apresentar aos estudantes universitários e do ensino médio, pesquisadores e ao público em geral o que se apresenta de mais expressivo no estado do Rio Grande do Norte.

No projeto “Prosas e Pensamentos”, que permanecerá até o mês de novembro de 2005, serão abordados assuntos sobre cangaço, poesia, urbanização da Cidade do Natal, história, artes, entre outros.

Sobre a Autora

A professora Flávia de Sá Pedreira nasceu em São Luís do Maranhão e cursou a graduação e o mestrado de História na Universidade de Brasília, doutorando-se em História Social pela Unicamp.

Desde 1994, faz parte do corpo docente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde atualmente desenvolve o projeto de pesquisa ‘Do outro lado de lá: olhares, saberes e poderes norte-americanos sobre o Brasil (século XX)’.

Sobre a Palestra

A palestra da professora Flávia de Sá Pedreira abordará o tema: "Carnaval em tempos de guerra em Natal", onde serão apresentados os resultados de uma pesquisa iniciada em 1995 e que culminou na realização do vídeo-documentário "...De Outros Carnavais", de 12 minutos de duração, e na elaboração da tese de doutorado (Unicamp, 2004), que foi publicada sob o título "Chiclete eu Misturo com Banana: Carnaval e cotidiano de Guerra em Natal (1920-1945)", pela EdUFRN, 2005.

Informações Gerais

Evento: Ciclo de palestras “Prosas e Pensamentos”
Local: Livraria Sparta
Data: 21/09/2005
Horário: 18:00h
Entrada gratuita
Palestrante: Profa. Dra. Flávia de Sá Pedreira
Tema: “Carnaval em tempos de guerra em Natal”

por Alma do Beco | 8:39 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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