quinta-feira, março 24, 2005

PARALELEPÍPEDA POESIA

Luís Henrique
Dia da Poesia 2005


Nos anos 70, a turma da poesia teve a idéia de comemorar o seu dia. Não me lembro exatamente qual o ano. Só sei que caminhamos, recitamos e folheamos os umbrais da década que reviraram e revigoraram os artistas e as pessoas com inúmeras idéias na cabeça. Lembro-me como se fosse hoje: movimentos aconteceram para sedimentar vozes, versos e sintetizadores.
Tudo, na sua maioria, de improviso. Poesia mimeógrafo, marginal. Arte alternativa. Poesia vertida e vestida em bares, lares e nos mares da nossa incontinência coletiva. Festejamos luas, ruas e vendavais. E as caminhadas com faixas, na faixa de pedestre ou avançando os sinais da voracidade londrina e provinciana.
Era tudo muito mestiço. Regado a véus, vinhos e vielas. Esse pessoal que toma conta da paixão pela palavra, que escreve em guardanapos, toalhas seminuas, que assessora corações e lentes, é cria, é filho da geração da graça incontida. Imã e cúmplice de alforrias verbais. Simpatizante da sopa de letras que agrega e consagra pecadores do tempo.
Somos inúmeros poetas. Veniais e virtuais. Marginais e abdominais. Consagramos a fome do estômago da nossa fértil usina tropical, a fortaleza de um paraíso pedido, tão amplificadamente gauche. Carregamos, como pessoas e poetas, a gravidez de um texto, o crepúsculo das f(r)ases soltas e penitentes.
E testemunhamos como lírios e humanos, a nitidez da vida. Cálida e pálida. Cinematográfica e recheada de ilusões.
Por isso, que dos suores que escrevo e que escorre da testa e da língua de quem ensaia revelações, de quem come o pão que o dicionário amassou, biscoitos são fermentados: vértices e ícones de um mesmo saco: escrever e ler é divino e é profano.
Assim, a saga de quem caminha e fala versos, é rascunhar na rua os estribilhos de uma esquina que não peca. Igual a versos soltos. Revoltos. Envoltos em reclames, alfarrábios da simétrica fé.
E já não era sem tempo, durante todos esses anos, caminhadas aconteceram, livros foram lançados, saraus apareceram, poesias foram musicadas, poetas foram falados, cantados, lembrados, amados.
Portanto, ver a vida com poesia é como sentir uma fisgada. Profunda e reveladora. Semelhante a uma crença quando engatinha. Ou ao burburinho de uma cidade do litoral nordestino. Forte e tão bela. Que por suas ruas passeiam rosas e reisados. Relicários e botequins.
Enfim, vestir a camisa da poesia, que pode ser amassada, engomada ou esgoelada. Ela pode levar chuva, bala, beijo e porão. Só não pode faltar paixão. E o perdão que só os nossos olhos alcançam.



Carlos Gurgel

por Alma do Beco | 7:40 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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