Ouviram-se as trovoadas.
Antes, o clarão tomara o céu noturno.
Luminosidade sombria !
Estrondos terrificantes !
As lavas desceram ao vale;
O calor tornou-se insuportável.
Os animais debandaram;
A terra começou a tremer;
A criança a chorar.
Os velhos tomaram seus terços;
As mães ajoelharam-se;
Impotentes sentiram-se os homens...
Triste história a do homem.
Feliz existência a do ser.
Lamentável verdade a da morte
A morte do homem
A ida sem volta
O chegar definitivo e último.
Desceu do céu a pomba
Pousando no galho ressequido da árvore.
Olhou a solidão em volta
E voou. Voou.
Ouviu o silêncio em todos os cantos
E, em cada canto, o gosto da morte.
Voou. Voou. Não captou outro sinal de vida
Senão os emanados do seu corpo santo.
E voou, compreendendo que era só
Na sua santa paz..
E voou mais ainda sentindo maior a sua solidão
Sua santa solidão
Sua paz.
- Sujeitei-os à prova...
Nenhum resistiu à voz do inferno;
Nenhum soube morrer como o filho;
Nenhum fez do filho semelhança;
Nenhum o entendeu.
Cumpriu-se o que eles mesmos anteviram:
Buscaram a morte.
Morreram...
Voou. Voou.
E cansou de estar só no seu universo
Na sua solidão.
Olhou os homens e chorou,
Chorou.
Sorriu como criança e voltou,
Pousando na mais alta pedra,
Onde ficou.
E pensou por sete dias, findos os quais, falou:
- Por que não fazer disso vales e rios,
Serras, montanhas cobertas de árvores e lagos,
Pássaros por todos os lados, animais ?
- Corra o rio !
Nasçam a planta
e os animais !
E pode voar tranqüila por mais sete dias
Em companhia da vida não assemelhada.
- Mas que triste egoísmo o meu
Que não faço a mim o meu maior prazer ?
Por que não deixar vir o meu semelhante ?
E voou. Voou.
Sentiu-se angustiada e voou.
Viu a beleza em volta
E o perfume
E toda pureza da vida.
- E eu lhes dei tudo isso e eles não viram.
Dei a beleza, destruíram...
Dei uma vida, destruíram...
Não souberam viver como o filho,
Morreram sem ter nascido...
Eduardo Alexandre