Everaldo Lopes
Tribuna do Norte
25/03/01
Foi num domingo de novembro de 1941, exatamente dia 31, que os poucos natalenses que possuíam rádio puderam ouvir a primeira transmissão de uma partida de futebol direto do estádio "Juvenal Lamartine". A emissora pioneira foi a Rádio Educadora de Natal (REN), mais tarde transformada em Rádio Poti, ao ser adquirida pelo condomínio Associado. A Educadora era de propriedade do empresário Carlos Lamas, que convidou para narrar a partida o jornalista Manoel Fernandes de Oliveira, conhecido também como "Leléo", irmão de um locutor famoso, que era Marcelo Fernandes. Na época, Manoel Fernandes tinha apenas 23 anos de idade, e muito cedo revelou desejo de ser também narrador de futebol. No último dia 4, aos 82 anos, faleceu o pioneiro da transmissão esportiva no Rio Grande do Norte e, por uma dolorosa ironia, cego e surdo. A cegueira adveio de um glaucoma mal curado.
Para a transmissão, que se transformaria num marco da radiofonia potiguar, a emissora convidou alguns nomes do rádio local, que colaborariam nos comentários e reportagens, designando o veterano apresentador de programas de auditório (havia sido goleiro reserva do América), Genar Wanderley, com a missão de ler os comerciais durante a narração da partida. A cada bola que saía pela linha de fundo, Wanderley lia, com voz impostada, os comerciais dos patrocinadores. Como não ficou nenhuma gravação para a história, não se sabe como foi o desempenho de Manoel Fernandes. Afinal, quem já tentou sabe que não é fácil narrar uma partida de futebol. Como curiosidade, vale acrescentar, que a programação normal da Rádio Educadora começava às 10h e era suspensa às 13, recomeçava às 16 e ia até 17, retornava às 18 e encerrava suas atividades às 22h.
A estréia
O jogo escolhido para marcar a primeira transmissão não foi tão especial. Na ânsia de mostrar "serviço", a emissora tratou logo de programar a estréia, escolhendo o jogo ABC x Santa Cruz, valendo o campeonato oficial da cidade. Como não havia ainda a comodidade do rádio portátil, acabou acontecendo um fato curioso: muita gente deixou de ir ao estádio justamente para ouvir a inédita narração. Até então, o norte-rio-grandense só tinha ouvido transmissões feitas pelas rádios Clube de Pernambuco, Nacional, Tupy e Mayrink Veiga, estas três últimas do Rio de Janeiro. Os ídolos do rádio esportivo da época eram Ary Barroso, Oduvaldo Cozzi e Luiz Mendes, do "broadcast" (palavra muito em moda, na época) carioca. Quem possuía os potentes rádios Phillips ou Mullard estavam familiarizados com os grandes nomes do rádio esportivo brasileiro. O ex-repórter Mário Dourado, por exemplo, quando ingressou no rádio natalense, levou com ele uma gaitinha igual à usada por Ary Barroso.
Após o sucesso da primeira transmissão diretamente de um estádio de futebol, a Educadora tratou de ampliar sua equipe de esportes, contratando os serviços de Alcântara Barbosa, Júlio Geraldo e Pedro Machado. Posteriormente, outros nomes foram surgindo, como o do narrador Chico Lamas, que teve passagem rápida, logo dando lugar a Aluísio Menezes, que formaria dupla famosa com Amaury Dantas, na Rádio Nordeste.
Dez anos depois, surgiria a Associação de Cronistas Esportivos, sendo Manoel Fernandes um dos fundadores, ao lado de Luiz G.M. Bezerra, Eider Furtado de Mendonça, Waldemar Araújo, Aluísio Menezes e João Neto. Com o advento do rádio portátil, o narrador de futebol já não podia "chutar" nem cometer deslizes, porque o próprio torcedor estava ali, vendo e, de ouvido colado no radinho, acompanhando a transmissão.
Nota do repórter: colaborou, Luiz G.M. Bezerra.