segunda-feira, fevereiro 14, 2005

... E os tiques voltaram



Edgar Allan Pôla

Pedrinho estava num dia altamente movimentado no seu point de boemia, atendendo a todos com contagiante bom humor, quando irrompe, bar adentro, Ivanísio Ramos, com cara de quem não só quer comer e beber, como gostar.

Gostar, claro, todo cliente quer e tem direito. Mas Ivanísio não estava mesmo era podendo gastar. Já na primeira abordagem, deixou isso claro:

- Pedrinho, hoje estou a zero de grana. No dia 30, porém, você sabe, estarei aqui para saldar o prejuízo...

Por incrível que pareça, nesse dia, Pedrinho ainda não apresentara nenhum sinal de que é portador de tique nervoso dos mais persistentes. A abordagem de Ivanísio, contudo, em nada alterou o seu estado: de bom humor estava, de bom humor permaneceu. E sem nenhum sinal do famoso espasmo nervoso.

Com obras no fundo do bar, a grana curta e muito serviço ainda por fazer, ele ficou meio sem jeito para negar a cerveja pedida pelo negão da Tribuna do Norte, repórter fotográfico da melhor cepa, ex-remador de clube náutico da rua Chile e de porte ainda atlético para um boêmio inveterado, já quarentão.

Verdade que Pedrinho estava sem condições para o pendura e, depois de uma conversa com sua mulher Ivone, responsável pela cozinha sempre movimentada do estabelecimento, resolveu chamar Ivanísio a lugar neutro e discreto, e sapecou a decisão:

- Ivanísio, meu amigo, estou com o bar em obras e a coisa está pegando. Vamos combinar um limite de crédito?

O negão, sempre muito gentil, não mostrou insatisfação:

- Libere pelo menos cinco, que está tudo resolvido e não vou sair daqui com mágoas.

Negócio fechado, Pedrinho chamou Eduardo a um canto e confidenciou:

- Eduardo, você sabe: Dennis é o homem das ampolas de 600 ml. Mas o negão é o das 600 ampolas... Se eu não der um freio, fecho a bodega em uma semana!

E saiu para atender os clientes que já faziam coro esperando reabastecimento.

Fim de festa, pelas 10:30h da noite, chega o psiquiatra André Pereira acompanhado de sua franca e irrestrita verve detonadora. Sonda o ambiente e senta, pede uma, outra, e, de repente, percebe que Pedrinho não apresenta nenhuma evidência de que é acometido pelo tique que todos, ali, bem conhecem.

Pergunta a um, a outro, e obtém a confirmação de que, naquele dia, Pedrinho, em momento algum, deixou-se levar pelo estímulo nevrálgico. Chama o turco a sua mesa e faz a observação.

- Pó, Pedrinho, você está de parabéns! Parece até que está curado! Hoje, não se deixou levar pelo tique nervoso uma única vez...

Foi tiro e queda. Mal ouviu aquilo e Pedrinho, intermitentemente, estava a balançar a cabeça para cima e para baixo, para os lados esquerdo e direito.

Sem dar mais trelas, desolado, Pedrinho comentou:

- Por que você foi lembrar, André?

Crônica publicada no Balalaika - Informativo Cultural, junho de 1997. Natal/RN

por Alma do Beco | 8:03 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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