13 de março de 1996, véspera de Dia da Poesia que, com o apoio da Capitania das Artes, prometia ser dos melhores. Logo cedo, encartado ao Diário de Natal, circulara o DN Verso X Versos que já trazia a marca da festa: excitamento muito de vates e amantes da poesia.
Durante toda a noite, no salão de exposições da “Hereditária”, a galera trabalhara as exposições e faixas que serviriam para a passeata poética do dia seguinte. No Meia Meia Quatro, à noite, comandados pelo performancer Pedro Pereira, ensaiara-se uma grafitagem geral nas paredes do decadente pointe etílico, reduto da mais renitente das boemias natalenses.
Nas paredes do pátio interno da Capitania, o artista plástico e band leader, Marcelus Bob, preparara um afresco tendo como tema os seus “encapuzados”, marca característica de suas intervenções em muros da cidade, e, cansado, amanheceu a sono solto, deitado no chão frio do salão de exposições, tendo como travesseiro uma fedorenta mochila gentilmente cedida por dirigente de conhecida agremiação beneficente cearamirinense, Fábio de Ojuara.
Ojuara fora o responsável pela pintura das faixas e, como Bob, também estava num prego danado, uma fome dos seiscentos diabos, louco que o sino da velha catedral batesse as oito badaladas que anunciariam a abertura das festividades com o esperado café da manhã, milimetricamente planejado pela agitadora cultural Danielle Brito.
Logo após o café, estava programado, haveria a abertura das exposições e o convidado especial, Jommard Muniz de Britto, dentro do “Projeto Falas”, discorreria sobre “Poesia: a que será que se destina”.
Tudo dentro dos conformes, num dos cantos do salão de exposições, no chão, as faixas preparadas à noite esperavam a hora da anunciada passeata poética. Quando menos se espera, sorridente, bem humorada, adentra o salão a ex-prefeita Vilma de Farias, iniciando suas visitas de pré-candidata à nova candidatura à Prefeitura Municipal de Natal.
Assistindo à cena, Eduardo Alexandre, que comandava computador ali instalado para receber poemas que seriam destinados à exposição da Galeria do Povo, dirige-se à ex-prefeita, agradece, em nome dos artistas, a construção daquele espaço destinado às artes potiguares, quando Ayres Marques, responsável maior por toda aquela festa, tem a boa idéia de registrar o acontecimento.
- Podemos bater uma foto, dona Vilma?
Solícita, a pré-candidata não colocou obstáculos:
- Pois não! É um prazer...
- Pode ser com uma das faixas que servirão à passeata?
- Claro. Nenhum problema. Diz a ex-prefeita, toda sorrisos.
Eduardo dirige-se ao canto onde estavam expostas as faixas e logo está de volta com uma que saudava conhecida figura folclórica da cidade e que serviria para abrir a passeata: “Viva Severina / Viva a rainha / Nossa governadora”.
Eduardo foi chegando e posicionando-se para a foto quando, curiosa, Vilma quis ver o que a faixa dizia. Quando leu o que estava posto, esquivou-se, depressa, da mira do fotógrafo:
- Não! Com essa faixa eu não permito a foto. E saiu, em disparada, driblando transeuntes.
- Mas prefeita, é só uma brincadeira... Insistiu Eduardo.
- Brincadeira, nada! Com essa faixa, vocês ficam sem foto. Eu é que não vou posar diante de tais ditos. Isso pode ser usado contra a minha candidatura...
Educado, Ayres mostra-se tolerante:
- Pode ser com outra, prefeita?
- Claro!
E nova faixa é providenciada para a foto: “No reino da arisia / tempo eros / Não sou mais de cetim”. Versos de Celso da Silveira, Diógenes da Cunha Lima e Marise Castro, respectivamente.