O comissário estragou o menino:
Severino 30 dias!
Glosas
1.
comendo à força a ajumenta,
uma bufa fedorenta,
esvaziando um salão,
festa de apartação,
um inverno promissor,
um vaqueiro aboiador,
um cachorro desnutrido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
2.
carregado de madeira,
tenta subir a ladeira,
com os bois quase se arrastando.
A sariema cantando,
inspirando o trovador,
papagaio falador,
putanheiro e enxerido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
3.
batata doce, tacaca,
repolho cru, mão de vaca,
e culhão de touro, assado;
dá um peido desgraçado,
ninguém aguenta, doutor.
A podrura e o fedor,
mata um homem enturido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
4.
lá no coreto da praça,
peidos de feijão macássar,
e as mentiras desfilando.
Aposentado prosando,
reclamando do calor,
estórias de caçador,
de convenção de partido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
5.
dormindo no alojamento,
bufas a todo momento,
som de peido e violão.
Muito feliz, o patrão,
olha seu reprodutor,
fudendo a todo vapor,
no curral, desinibido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
6.
a fogueira de São João,
forró quente no salão,
é uma festa muito rica.
Mais contente ainda fica,
quem sarra com o seu amor,
no escuro, sem pudor,
no levantar do vestido,
Isso é cagado e cuspido
Paisagem do interior...
Aos amigos (as) do Beco e adjacências,
Bob Motta
Dr. Eider Furtado, o autor
Do nome do Trio Yrakitan
Mais de trezentas pessoas prestigiaram o espetáculo realizado pelo Trio Yrakitan, na noite de sexta-feira, 26, no antigo jardim do Palácio Potengi, hoje Palácio da Cultura. O famoso grupo vocal, um dos melhores da América Latina – só foi superado pelo Los Panchos –, já na sua quinta formação, está fazendo 55 anos de existência.
Parabéns, Dr. Eider, pela valiosa colaboração prestada à música brasileira e pela correção histórica.
Luiz Gonzaga Cortez
Diário de um milionário
Sempre fui feliz, aí veio a loteria. Minha vida mudou. Mudou e muito, desde de que ganhei a bolada. Alguns dizem que para melhor, outros silenciam. A verdade é que mudou. Depois de conferir os números, procurei logo um lugar pra esconder o diabo.
Guardei o bilhete premiado por um mês, dentro de um plástico, e de outro, e de outro. Depois coloquei dentro de uma pequena lata de achocolatado e enterrei no quintal. Esperei, desaparecer, a curiosidade dos residentes da minha cidade. Passei a maior parte do tempo sentado num tamborete, olhando pro pedaço de chão onde meu bilhete estava enterrado. Vigilante. Dormir? Nem pensar. Apenas cochilos. Não saí mais de dentro de casa. Nem recebi os amigo. Disse que estava ocupado sempre que batiam na porta. Fiquei de boca calada. Afinal, estamos falando de dez milhões de Reais. Dez, com D maiúsculo.
Sofri muito com o calor daquele mês, mas agüentei firme trancado dentro de casa. Até a idéia de abrir a janela pra arejá-la me assustava. Não queria que ninguém me visse. Após os trinta dias, fui buscar meu prêmio numa agência da Caixa. Na cidade ninguém mais falava da loteria, e nem do ganhador.
Como as coisas mudam quando ‘cê tem dinheiro!
“Só o dinheiro mesmo, se o senhor não se importar,” respondi espantado. Nunca ninguém tinha me chamado de senhor. Nos meus trinta anos de vida, esta foi a primeira vez.
Essa conversa durou mais de hora. Finalmente, abriram uma conta, pois nunca tive uma, e depositaram toda aquela dinheirama. Faz três anos que ganhei os dez milhões. Faz três anos que mudei de minha cidade.
Tenho dinheiro para fazer o que quiser. Carros? Tenho quatro. Moro numa casa grande. Tem piscina, um jardim bonito, e vários quartos de hóspedes, embora ninguém nunca tenha vindo visitar. Nunca dei chance para os velhos amigos se aproximarem. Tenho medo de quererem meu dinheiro. Namorada? Quero não. Dizem que depois de um certo tempo elas têm “direitos”. Evito contato com a minha família também. Eu era muito próximo das minhas irmãs e dos meus pais. Hoje, não mais. Eles ainda são pobres. Sempre ajudei eles, quando morava lá na cidadezinha. Hoje tenho cisma de ajudar. Pode ser que fiquem dependentes de mim. Do meu dinheiro.
Minha única companhia é a caneta e o caderno. Escrevo pra mim mesmo. Tipo um diário. Não tenho para quem escrever. Poderia escrever pra minhas irmãs ou amigos, mas tenho medo que descubram onde moro. Eu era mais feliz. A vida mudou muito....
Charles Phelan