Enquanto Londres envolve-se no manto da indignação e do lamento pelas bombas da semana passada – que deixaram um saldo horripilante de 50 vítimas, a hipocrisia dos londrinos (imprensa, políticos, igreja) aponta o dedo para a lua e se esquece que em assim fazendo deixa quatro dedos apontando para si mesmos.
Shahzad Tanweer, 22 anos; Hasib Hussain, 18 anos; Rashid Facha, 21 anos; Jacksey Fiaz, 35 anos, casado com um filho pequeno. Terroristas, segundo o Ocidente. Muçulmanos em desespero, segundo Al Jazeehra. Serão esses jovens os únicos responsáveis pelo massacre de Londres? Serão esses jovens, que deliberadamente deram cabo de suas próprias vidas (fato que jamais é mencionado em profundidade, reduzido a uma expressão tão típica de nossa gramática fascista: terrorista-suicida), os únicos responsáveis pela seqüência de fatos históricos que os levaram a cometer aquilo que Camus considerava o único ato sério na vida de um ser humano?
O nazismo não foi responsabilidade de Hitler. O fascismo não foi obra de Mussolini. Foi obra de cada um dos indivíduos que compunham as sociedades alemã e italiana da época. Foi obra do padeiro, do sapateiro, do dono da quitanda, do jogador de futebol, do pintor de paredes, do banqueiro, do padre e do sacristão. Todos eles ajudaram a construir o monumento à destruição polido por aqueles dois cavaleiros negros.
Dizer que o “terrorismo” mundial é obra de Bin Laden ou Abul Abass é apontar o dedo para a lua. É esquecer que um Ocidente canceroso de ganância, estupidez, ignorância e mercantilice, ávido pela mais-valia, sedento pelo lucro, pela casa própria e quanto-mais-moderna-melhor, pelo carro do ano, pela tostadeira digital; esse Ocidente que paga bilhões a um jogador de futebol analfabeto e salários de merda aos seus trabalhadores; esse Ocidente que elege os Bushs e os Blairs da vida, esse Ocidente é mais responsável pelo terrorismo ou pela violência que o fanatismo de um príncipe árabe enlouquecido pelo desespero.
O mundo inteiro sabe, a essa altura da carnificina, que tudo começou com a cobiça dos dois paises mais ricos do mundo pelo petróleo do Oriente. Todo mundo sabe, a essa altura, do massacre bilateral e sanguinolento, que tudo começou quando os hidrófobos republicanos norte-americanos, aliados aos conservadores trabalhistas ingleses, decidiram reeditar os feitos de Eleanora de Aquitania e Henrique III: conquistar as riquezas do Leste porque as do Oeste estavam minguando. Essa sempre foi a nossa história. Essa sempre será a nossa história até que nós, nós mesmos, não a ONU, não o Vaticano (hoje em dia regido por um ex-nazista – eu disse “ex”?), não esse ou aquele regime. Nós, indivíduos, seres humanos, éticos, morais, conscientes, acordados para a vida e não para a morte, a ganância, a prepotência, até que nós ponhamos um fim nisso, escolhendo correta e justamente líderes e políticos, aos quais pagamos para fazer o trabalho que desejemos.
Porque então a mentira, a hipocrisia, a desfaçatez de buscar razões humanitárias e falsamente lógicas para explicar uma coisa que Wilhelm Reich tão bem descortinou há mais de meio século: o homem destrói porque isso lhe dá prazer. Isso substitui o prazer erótico, amoroso, que ele mesmo reprimiu e anulou ao longo de dez mil anos de existência (ou inexistência). O Estado, as Leis, a chamada “Moral de Costumes”, Contenção, a negação do estar-livre-no-mundo, fizeram do Ocidente e do Oriente um terreno fértil para a propagação do vírus da ignorância. Husserl e Huxley dedicaram suas vidas à diagnose desse fenômeno.
A obstinada fixação do Ocidente em espalhar “democracia” pelo Oriente tem um cheiro de conquista carolingiana que a mim, pelo menos, não engana. Tem enganado, porém, metade do mundo civilizado, boa parte das mentes ditas cultas e inteligentes, as quais recusam-se a fazerem a si mesmas uma só pergunta: por que o nosso estilo de vida deveria ser o padrão do mundo? Porque as nossas doenças psicológicas deveriam ser transmitidas para todos os países do outro lado do mundo? Quem disse que princípios democráticos adotados por nós devem ser a tabula rasa para todos os países do outro lado do mundo?
A resposta é muito simples: arrogância, desprezo, prepotência. E quando esses três cavaleiros se juntam, atraem o quarto: ignorância.
Ninguém é inocente nessa guerra que nós mesmos provocamos. Ninguém. Quem quer que se proclame acima dela está mentindo. É um avestruz enfiando a cabeça na areia, enrolado numa bandeira nacional, ou num livro de orações ao deus desconhecido.
Marcílio Farias
Oswaldo Ribeiro
A DIMENSÃO ONÍRICA DA MATÉRIA...
“O artista é aquele que fixa e torna
acessível aos demais humanos o espetáculo
de que participam sem perceber” (Merleau-Ponty)
A afirmação glauberiana explica como a arte destrói a brutalidade da matéria,
impondo-lhe a fantasia e a pureza transitória da forma.
Expressão de emoções e desejos, numa ação criadora de procedimentos inéditos para a invenção de objetos.
Eternidade e fugacidade simultâneas: seu pertencimento ao contexto onde se encontra
e sua inserção em uma tradição é que lhe dá sentido.
O artista reflete sobre a sociedade, seja para criticá-la, afirmá-la ou superá-la.
Um caminho de interseção entre o singular e o universal, o particular e o geral;
através da nuance de uma obra artística, temos o acesso ao significado de uma realidade.
Arte não é apenas alegoria e símbolo. É algo mais profundo, leva-nos a descobrir o sentido da própria história.
A arte faz ver a visão, falar a linguagem, ouvir a audição, sentir as mãos e o corpo,
emergir o natural da natureza, o cultural da cultura.
Arte é, pois, revelação e manifestação da essência humana, esquecida em nossa efêmera existência cotidiana.
Onde encontrar raízes, delimitar rupturas, denotar raridades, distender “ismos” ou tendências?
Na proto-história, exuberância em instigantes registros para a posteridade, em duas vertentes da arte lítica:
a “Nordeste” (Mirador/Parelhas e Pedra do Alexandre/Carnaúbas dos Dantas), riqueza em ritos cosmogônicos;
e, a “Agreste” (Lajedo Soledade/Apodi), presença de antropomorfismos totêmicos.
A deflagração abrupta da civilização desnuda e se apropria da paisagem,
a fortaleza poligonal/estelar do Gaspar de Samperes;
os batavos Frans Prost, Jorge Macgrave e Albert Eckhout desvendam nossas paragens em desenhos geo/etnográficos.
Contemporaneiguarmente, o retratismo de Moura Rabelo. Palatinik ensaia o movimento perpétuo via arte cinética.
Erasmo Xavier, na Art Deco/Nouveau, extrapola os fronts da província.
Precursor-modernista, Newton Navarro deglute as vanguardas (“ver com os olhos livres”).
Tessituras cubistas nas tapeçarias do Dorian Gray. Impressionismo fulgurante do Thomé Filqueira.
Intimismo Expressionista em Leopoldo Nelson. Transfigurativismo fantasmagórico da Zaíra Caldas.
O pop-concreto “1822” do Nei L. de Castro conflui ao poema processo, projetando o verso/língua para o universo/linguagem e culmina na visualidade poética do A. de Araújo.
Falves Silva, bocetas e concretude minimalista das sêmias até a exaustão sígnica.
Temporadas no Inferno & Iluminações, Dunga escancara as portas da “Galeria do Povo” e sacramenta a Praia aos Artistas. Vatenor, “praias sombreadas de cajuais”. Non-sense nas cores do Ítalo Trindade. Gilson Nascimento, Hiperealismo conga.
Grafismo ensandecido do J. Medeiros e o intróito da performance amálgama. Lay-outs aluados e Venancianos.
Ulteriores humanóides Bobianos. Experimentalismo ousado do Júlio Revoredo.
Fernando Gurgel caracteriza a geração 80 (Pargue Lage) intervindo na tela/suporte, rasgando, colando.
O desbunde pictórico de Flávio Freitas. As linhas caricaturais em Léo Sodré. Saudades do Novenil...
Pedro Peralta Pereira prova que na labuta criativa não existe apenas “dom”,
mas movimentos corpo/mente - transpiração e inspiração em comunhão.
O Oxente (Guaracy, Sayonara e Civone) transgride conceitualmente nas “instalações” e
desemboca no M8M - o limiar do fazer engajado.
Busca frenética em Valderedo Nunes, Fábio Eduardo e Franklin Serrão. Marcelo Fernandes abstraí-se na cêra.
O blague nos traços dos cartuns do Cláudio e Edmar. Nativismo lúdico do João Natal. A arte Brut do Helmut.
O “naif” /ingênuo em Djalma Paixão, Estelo, Iaperi, Nivaldo, Jotó, remetem às faces melancólicas do Assis Marinho. Simplicidade popular e mágica dos bonecos do Chico Daniel e Zé Relampo; no boi de Marinheiro;
nas esculturas de Manxa, Ojuara e a talha ontológica do Jordão, no Riomar; no sacrossanto do Chico Santeiro.
Na fotografia, das reminiscências veladas por Manuel Dantas à plasticidade transluzente de Giovani Sérgio.
Os vídeos paridos no quengo do Augustululante. A redenção da sétima arte na película Boi de Prata do Augusto Ribeiro Jr.
Enfim, tais protagonistas, em antropofágica profusão estética, combinando experiência de saberes e vertigem das sensações, configuram instrumentos eficazes de legitimação e pertença do imaginário Potiguar.
Plínio Sanderson
Túlio Ratto
Léo
Hora extra
A sala de audiências da Junta de Reconciliação e Julgamento da Justiça do Trabalho estava cheia naquela manhã chuvosa em Campina Grande, Paraíba. A questão, que envolvia uma trabalhadora de motel, precisava de muitas testemunhas, pois abordava horas extras que não haviam sido pagas.
De um lado, uma jovem com um olhar assustado de quem nunca havia visto uma coisa daquelas. Ao seu lado, um jovem advogado, com cara de quem está começando o ofício. Do outro lado da mesa, o dono do estabelecimento e seus dois advogados.
O comerciante, com longos cabelos e barba por fazer, mantinha um ar de quem já ganhou a “parada”, com um constante esboço de discreto sorriso. Ao redor, várias testemunhas do labor da reclamante e outras tantas do reclamado devidamente orientadas para dizer o contrário. Ao fundo, defronte à junta – que nesse tempo era composta de um juiz togado e dois classistas, vários estudantes de direito.
Com a cena armada, o juiz presidente inquiriu as partes para um acordo que não aconteceu diante das negativas do reclamado, cônscio de uma vitória. Ele, então, passou a instruir o processo, lendo, inicialmente, a reclamatória. Depois, ouviu as partes e algumas intervenções dos advogados e passou a escutar as testemunhas de cada lado.
Inicialmente, as do reclamado, que, sob juramento e um provável medo de perder seus empregos, afiançaram que a reclamante jamais havia dado um só minuto de labor extra.
As testemunhas da reclamante, exatamente o contrário: disseram que a jovem trabalhava durante toda a semana sem um só dia de descanso, nem sequer nos sábados e domingos. “Uma verdadeira escravidão” , como observou uma senhora gorda, identificada como ex-cozinheira do tal motel. Diante do contraditório, não sobrou ao juiz outra opção que não fosse um novo interrogatório das partes.
Resta dizer que o magistrado era um zeloso cumpridor das ordens divinas e, já beirando os quarenta anos, continuava se reservando sexualmente para uma noiva que ainda não havia aparecido em sua vida. Freqüentador de missas diárias, era cuidadoso no uso das palavras, orgulhando-se de dizer que “durante toda a sua vida jamais havia dito um palavrão”.
O imaculado juiz começou o interrogatório pelo dono do motel, que negou insistentemente que sua ex-empregada trabalhasse fora do horário normal, mesmo sendo num estabelecimento que funciona 24 horas por dia e acumulou dois bons “carões” por ter dito algumas palavras que o juiz achou inadequadas para uma audiência de instrução processual. Aliás, depois disso, seus advogados passaram a cochichar insistentemente no seu ouvido em busca de um acordo.
Depois, foi a vez da jovem trabalhadora.
- A senhora trabalhou quantos anos para o reclamado?
- Eu não trabalhei para esse homem, não. Eu trabalhei para esse sem-vergonha que está aí na frente...
- ... Reclamado - é o que ele representa aqui. E modere suas palavras!
- Vige! Quer dizer que dono de cabaré agora se chama reclamado?
- A senhora está brincando comigo? Sabe que eu posso mandar lhe prender por desrespeito à corte? Contenha-se!
Nesse ponto, o santo magistrado já estava completamente vermelho. Onde já imaginou – pensava – dizer a palavra cabaré na minha junta? Essa mulher está com o cão no couro!
Recomeçou:
- Qual era o seu horário de trabalho?
- O dia todo.
Impaciente, o juiz explicou:
- Eu quero saber a hora que a senhora começava e terminava!
- Eu começava às 06 da manhã e ía embora depois das 22 horas.
- Tinha intervalo para o almoço?
- O que é intervalo?
- Tempo para comer, ir para casa, etc. Um período determinado pelas leis trabalhistas. Enfatizou didático.
- Tinha não.
- Quer dizer que não tinha intervalo de almoço nem folga nenhuma?
- Ah! Foda tinha. Todo dia ele dava duas comigo...
BECOPRESS
ONTEM
A CPMI dos Correios ouviu o ex-presidente dos Correios, o
diretor técnico (que quase foi preso por causa de um
descuido de um "não") e um diretor da empresa Skymaster
Aerolines, todo "enrolado".
Alguns parlamentares, entre eles o franciscano Pedro Simon
(PMDB/RS), defendem que todas as comissões de inquerito
correlatas (Correios, Bingo e Mensalão) se transformem
numa só. Outros, perdem tempo com longos discursos,ao
invés de perguntas objetivas. E outros saem até do contexto,
com indagações evasivas ou repetitivas.
Lulla, digo, Lula, estava em Paris.
ALTA PRODUÇÃO
Circula na internet a informação que centenas de fábricas de
cueca estão reestilizando alguns modelos para que recebam
pinturas de notas de 100 dólares. Algumas têm até bolso e
porta moedas. Outras, são enfeitadas com estrelas e
babados que imitam a moeda americana. A mais cara, que
seria vendida na Daslu de São Paulo, vem até com uma
passagem para Fortaleza/CE, com direito a acompanhante.
CPMI
Um jornalista da terra desconfia, diante da quantidade de
CPMI´S que existe atualmente, que diante do que for apurado
(sonegação fiscal, etc) na loja Daslu, a mais cara do Brasil, a
possibilidade da "CPMI das Peruas" não está descartada.
ENTREVISTA
O programa "Câmara Cultural" (TV a cabo 37) entrevistará
amanhã o cientista político, escritor e poeta Chagas Lourenço
e o artista plástico Vicente Vitoriano. O programa é gravado
e vai ao ar nos dias 21 (20 hs), 23 (09 hs) e 24 (09 hs).
AQUI NÃO
Excitados turistas sexuais da Holanda não tiveram o gostinho
de pousar no Aeroporto Augusto Severo. Um avião lotadinho
de homens com idades de 25 a 40 anos foi desistimulado pela
Secretaria Estadual de Turismo de aportar nas terras de
Cascudo.
Leonardo Sodré