quinta-feira, maio 12, 2005

SAN JACYNTHOS



A Peter Gabriel e Zeca

I

Uma goela escancarada - pombos e o rastro do
horizonte — arcadas fantásticas — arcanos —
montanhas que escavamos no sonho, num
musical TODD-AO com panavision e cabeças
sim, cabeças femininas avermelhando o
chão como se fossem cocos.
— Uma goela escancarada — ouvidos — ouvimos
— um morcego - a labareda no colarinho da colegial
“molhadinha molhadinha”
just in the heat.

II

Como se fosse tudo — um carinho jeitoso e
dengo ali entre as mangueiras — proposição de
amante: ficando junto de você o tempo todo.
Proposição de amante: ir sempre sozinho, ir
sempre sozinho — junto — como se eles
(todos) honoráveis bastiões da saudade - todos eles,
sim, todos eles fossem salas carpetadas, lustre venezino
- espécie rara de naditude: assim o mono se des
pede

III

E assim, no vigor das palmeiras uma
passagem impensada — mais do que as
labaredas, além de um bosque —
saltério — coração dilacerando esse amor e
ali então um redundante espaço de
expectâncias e assim, ali, um engradado de
alegrias em cada pedaço meu lançado ao sentimento

IV

um rosto petrificado e sem sal — borboleta,
pássaros receosos — libélulas estilhaçadas como
leques japoneses — teu rosto na pista do
contato — um tato entre escuros que
se assemelham — tarântulas e serpentes num
arrozal — outros rostos petrificados, enfileirados

p

rontos e eternos esperando, esperando, esperando.
Daisy, Daysi e Porciúncula Menezes, três claros pe-
tardos letárgicos dos Ribentes. E ali, no
óbvio rosto das estátuas reluz uma coisa sinistra.

V

Folhas verdes sobre
folhas douradas sobre
folhas verdes sobre
folhas douradas sobre
folhas verdes entre
espaços cambiantes

VI

Um rádio digital — saudações afetuosas de
uma tia ranzinza, burra e sonsa — um átomo de
exaltação doméstica: barrigas e peitos se aconchegando morta-
lhas, beiços e mãos que nunca souberam do amor.
Inda assim o rádio digital toca guarânias insuportáveis e
alguém lê um horóscopo chinês intolerável.

VII

(quero segurar teus ombros
mais-chegar teu rosto e
falar bem lindo —
“sabe que eu te amo há
muito tempo ?”)

VIII

Um corpo dependurado frágil numa
vivência mais frágil: besta,
ventre acotovelado de rostos, anseios e
anos-bons; besta, olhos afundados no
receio, rádios em programas policiais,
ignorância e morbidez ali, naqueles
quartos, naqueles homens.

IX

rostos escavados em mantras, iantras e
posições exóticas: eles se curvam procurando as
suas sombras que jamais são vistas,
seus reflexos perdidos no hálito matinal —
rezas
novenas e
olhos fitos num ponto qualquer.
Estátuas e vermes sendo pasto dos
pombos: assim eles vivem.
Estátuas e pombos sendo pasto das
cidades: assim se compreendem.

X

Um zumbido lerdo — como traças e
sombras, silhuetas sem risco numa
paisagem azul — tal e qual, tal e
mesmo — enquanto os anjos acordam e
desembestam fogos interiores.
Recursos de efetiva eternidade -
vento nas palmeiras e calor na
ponta da pele — dois e
três e infinitas possíveis idades —
esse amor.

XI

e acima de tudo e acima ou abaixo — um monte de
margaridas, meus labirintos e os teus —
nossos labirintos — como se o
tempo retrocedesse um beijo, um
aceno ou mesmo a perfilância dos
alabastros na cadência que o sangue
enseja — sem mesmo esses “comos”,
apenas o pulso da intenção e o
bater do gongo solene.

XII

Desfio, teço uma palavra pra caber no
meu percurso — itinerários incomuns
achados aqui, tinindo no osso —
o pescador e seus peixes e um
idiota inútil catando baldias palavras entre
rochedos cotidianos — azul profundos da
Prússia em
sentimentos calejados — suores e
praias e pedras quentes calcinando os
males do mundo — “nademos mais um pouco e ali,
verde e azul profundo sobre cada galho de
árvore, um rapto de sensualidades escancaradas”.

XIII

Pouco depois de um desalento conhecido,
familiares abordagens do amor, dos
vaticínios que explodem na pele,
rebentam sonhos e poemas — nos
alcançam em verdades pensáveis.
Pouco depois desse desalento, um dia e
outro dia e nosso coração atento.
Leio sobre libélulas estraçalhadas.
Creio nas janelas estilhaçadas.

XIV

O leão e o respingo do ar ali, no
canto do olho — teu gesto sutil como a
linfa e o desenho sereno como um
traço — algumas pontes se distendendo entre
mim e ti, e essas distâncias onde habitamos além
dos tropeços — uma savana — nossas imaginações de
paralelo teor — um gracejo amigável e teus vastos
instintos.
O leão, sim, e as verdades imagináveis.

XV

Um pouco de nossos anseios ali, acolá, nas
escadas adulteradas pelas nossas sintaxes;
mão e culhão numas rimas doidas engendradas no
meio da missa — (dona Lulla e seu
filho frade comendo biscoitos e
cuscuz de leite — uma lagarta, uma
lacraia e o berro de Eustásia) —
pequenos instantes, sim, enquanto
pássaros nos ensinam quiálteras.

XVI

E o pastor te guia entre essas dunas,
uma voz como uma flauta como um
corpo entre arbustos; sabores de
pitanga e mangaba — acridoce encanto
desencantado nesses lances. Há, sim,
uma litania de alegria e
desejos em nossos dias felizes —
temos um labirinto de amoráveis
quimeras que nos resguardam os dias.
E o pastor de guia entre essas dunas.

XVIII

Tomar uma canção e erguê-la muito —
assim dizem o nova-iorquino e este anseio:
tome uma canção e deixe-a estrondejar suas
veias. Como essas fogueiras que se acendem altas-horas
num clima de criança e memória. Tomar uma
canção e estendê-la além dos nossos
limites. Provocar as figuras de nossa imaginação e
superá-las todas além de uma memória eventual e
histórica. Tomar uma canção e vê-la em
nossos próprios episódios.



Marcílio Farias
Brasília - Natal janeiro/fevereiro 82/3

por Alma do Beco | 6:01 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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