quinta-feira, fevereiro 03, 2005

O reinado da alegria


Gutemberg Costa
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O rei momo e a rainha são figuras peculiares na história do carnaval natalense. Sabe-se que a introdução do personagem carismático e gordo no carnaval brasileiro deu-se com o aparecimento de uma figura de um boneco de papelão obeso que percorria as ruas durante os dias de carnaval.
Depois, o tal boneco foi substituído pela eleição de um folião gordo, alegre e dançante que recebia, simbolicamente, a chave da cidade das mãos dos prefeitos, com a ordem de comandar os festejos carnavalescos da cidade e espalhar a alegria no povo. No passado, como todo rei e rainha, ainda dispunham de uma corte para acompanhamento, constituída de seguranças e músicos corneteiros para anunciar a solene chegada aos clubes, além de motoristas particulares e quem mais o rei achasse no direito de fazer parte de sua corte.
Na época da Segunda Guerra, o nosso rei momo foi o popular folião Zé Areia. O escritor Augusto Severo Neto conta em suas memórias que o Zé Areia vendo a pompa de um rei momo nos anos setenta, teria feito o seguinte comentário: "Como rei momo não tive esta sorte!". Nos anos sessenta, tivemos o gordo Manoel Basílio, que saiu da gerência de uma casa comercial de tecidos para o reinado de carnaval.
O pernambucano Paulo Maux (1934-1984) foi um dos mais gordos do reinado momesco local e também foi o que teve o mais longo período como rei do carnaval. Foram 17 anos de reinado. Em 1984, quando entrevistei a viúva de Paulo, dona Elba, a mesma foi contando-me parte da história dos carnavais em que seu esposo era imbatível nas eleições. Ela estava emocionada, entre lagrimas e risos. Entre outras curiosidades, dona Elba, soltou esta: "Num carnaval do passado, no clube América, um grupo de rapazes da alta sociedade jogou Paulo de uma sacada para o chão. Ele tinha muita gordura para lhe aparar na queda e talvez por causa disto só sofreu uma fratura em um dos braços. Paulo não deu queixa na polícia e terminou o carnaval como se nada tivesse acontecido, perdoando os súditos adeptos de brincadeiras de mau gosto.
Outra vez soube de última hora que ia ser "seqüestrado" quando lhe fizeram um convite para ir a Natal. O "seqüestro" do rei era sempre arquitetado pela corte de outro rei não oficial de nome Severino Galvão. Se acaso o Paulo ficasse "preso" em alguma granja ou residência, era tempo livre para seu concorrente Severino comparecer aos clubes e reinar com a pompa que o carnaval naquela época oferecia ao rei e sua corte. Paulo, desconfiado, só atendia ao convite oficial da prefeitura e dos amigos mais chegados.
Dona Elba Maux contou que uma moça candidatando-se a eleição de rainha sem o devido conhecimento de seus pais, quando ganhou a escolha, para sair ao lado de Paulo, teve que levar consigo sua mãe, que a acompanhou nos bailes noturnos das dezenas de clubes de então.
Paulo quando enveredou pela política partidária ao lado da oposição ao regime militar perdeu a sua única eleição para a Câmara Municipal de Natal. Dizem que foi vítima da famigerada propaganda do "Já ganhou". Dona Elba gentilmente doou várias fotografias de seu acervo particular dos melhores momentos vividos por seu esposo, pai de sua filha e rei para sempre.
Mais tarde, outro gordo, o magarefe Sebastião, apelidado de Beré, brilhou no carnaval de Natal e, na história, foi o primeiro rei momo de cor escura, pois o segundo foi Givaldo Batista, que saiu do rádio e jornal para o reinado de momo. O rei Beré ficou decepcionado quando da primeira eleição direta: perdeu para o magro Severino Galvão no ano de 1985. Nesta eleição, Severino Galvão entrou para a história como o mais idoso deles, com 70 anos de idade.
Neste seu primeiro reinado oficial, o ex-rei momo Severino, de protesto, teve ao seu lado como rainha eleita, a prostituta Natividade de Souza, que morava nos prostíbulos da rua São Pedro do bairro das Rocas. A pobre senhora Natividade, chegou a ser rainha numa armação do carnavalesco Evaldo, que a inscreveu por sua escola de samba. Dou o testemunho do trabalho que a mesma deu para cabeleireiros e maquiadores...
A eleição direta para a escolha do rei e da rainha foi uma popular criação do então secretário municipal Geovani Rodrigues, no governo Marcos Formiga, que não contava em seus planos com a brejeira do carnavalesco Evaldo. A rainha Natividade brincou e reinou, com todo respeito, seu reinado e sem discriminação alguma quanto a sua velha profissão...
Nos anos 90, o rei momo Tomaz Neto, passou de comerciante de restaurante a rei, graças a varinha de condão do jornalista Adalberto Rodrigues que o apadrinhava. Neto, considerado magro, seguindo os conselhos de Adalberto, vestia uma folgada fantasia recheada de espuma, o que triplicava a sua massa muscular. E, assim, milagrosamente, ele tomou conta da chave da cidade por seguidos anos.
O primeiro rei momo intelectual que tivemos, foi o professor, escritor e historiador João Alfredo, que reinando por vários anos, ainda é o rei. Todos os anos, veste sua fantasia e, com a coroa na cabeça, vai ao lado de uma rainha andando a pé ao lado do povo e dos foliões da banda do Siri da praia da Redinha.
Outro que entrou para a história como o primeiro babalorixá a ganhar uma eleição para rei, foi Josué Santiago, que, com a ajuda do padrinho Adalberto, reinou mais de uma vez em nosso carnaval. Josué foi também o mais triste, de cara fechada, que, segundo os boatos, não mostrava os dentes nem para dentistas. Parecia mais um santo de altar, de tão duro que se apresentava no meio do povo, sem o gingado e a alegria dos gordos Paulo e Beré.
A respeito disto, um comentarista de um jornal local chegou a fazer o seguinte comentário: "O rei Josué parece que havia comido alguma coisa que não tinha gostado e não estava passando bem.”
Muita coisa deve ser acrescentada à história dos reis momos que promoveram a folia na cidade dos reis magos. Existem ainda entrevistas, velhos recortes de jornais e fotografias que podem, algum dia, compor um respeitoso acervo. Afinal, rei é rei, como diz o ditado popular.

por Alma do Beco | 1:12 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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