sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Berilo, o simples

Berilo Wanderley

Woden Madruga

Berilo Wanderley morreu quando chegava aos 45 anos de idade. Foi jornalista, professor universitário, promotor público, crítico literário e de cinema, boêmio, amante de vinhos e da música, poeta.
No jornalismo, a sua atividade intelectual amadureceu na crônica do cotidiano, gênero que dominou soberano juntando a técnica da informação jornalística, fundado no factual que soube aprender no dia-a-dia das redações., ao talento literário que mais nele era intrínseco e que veio a desenvolver no longo e sofrido aprendizado existencial e na leitura dos melhores autores.
Cronista, Berilo foi um escritor e ao mesmo tempo jornalista que sabia esgrimar a arte da palavra, como fenômeno estético, preocupado não somente na empatia do leitor, mas, também, em lhe oferecer o registro dos fatos reais, descrevendo os acontecimentos que ocorriam no espaço provinciano ou àqueles outros, além fronteiras, que normalmente repercutiriam no universo local.
Nesse ofício, BW muitas vezes transmudava e recriava uma nova realidade e aí, tínhamos o traço marcante do ficcionista se conflitando com o repórter. Suas crônicas nos chegavam com os primeiros contornos do contista/novelista que nele existiu em potencial, mas que a atividade diária de jornalista ao lado de outras que necessitava para a sua sobrevivência, obrigavam-no a deixar na poeira das gavetas seus planos literários mais audaciosos.
Berilo foi um lírico e um romântico. Um lírico telúrico, voltando “as coisas da natureza, o canto e o vôo dos pássaros, as flores, os rios de sua geografia sentimental, o pôr do sol, o amanhecer do sertão, o pastoreio das ovelhas, o cantar dos galos madrugadores, as cores do mar, as manhã ensolaradas, tudo que captava a sua profunda sensibilidade de poeta.
Foi um romântico no mais verdadeiro sentido chapliniano. Aqui, temos o cronista urbano anotando os pequenos dramas e comédias da cidade, retratando heróis humildes -–formidável criador de tipos – caricaturando os poderosos e prepotentes que nunca escapavam a sua crítica mordaz e à ironia fina, capazes de levantar o roupão que veste o ridículo desses falsos deuses.
Foi um satírico de tipos e costumes.
A comédia humana sempre esteve presente na sua crônica diária. São histórias pungentes, trágicas, burlescas, ridículas. História de amor, humanas, porque na obra de Berilo está presente a própria e inescapável crônica da condição humana. E, por isso mesmo, na leveza do seu estilo ágil e aprimorado, intimista e coloquial, simples e paratático, no texto enxuto que tanto lembrava Eça e Machado, dois de seus autores prediletos, vamos encontrar a preocupação metafísica, o problema social, a questão política.
Sim, porque Berilo, aparentemente um observador do banal cotidiano, nunca se divorciou, porém, da realidade de seu tempo, pois ele próprio foi um homem de seu tempo que sabia transformar e dimensionar com equilibrado nível de consciência, o trivial em motivo de reflexão.
O ofício do cronista foi também – e porque não principalmente – um ato de profundo amor, pois sabia que a vida é amor na lição mertoniana. Sua arte e seu jornalismo estão sulcados o respeito aos direitos do homem, à liberdade, à justiça, às coisas simples da vida, não fora ele um cultor da simplicidade. Poeta e homem, difícil, é muito difícil, separar em Berilo o esteta/criador da grande e rica personagem que ele foi dessa tragédia que, sendo de todos nós, foi sua – a tragédia existencial – que é de todos os homens porque é da natureza humana

Natal, agosto de 1980

In O menino e seu pai caçador – Crônicas. Berilo Wanderley
Co-edição Clima/Fundação José Augusto – Natal, 1980.

por Alma do Beco | 3:40 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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