segunda-feira, janeiro 31, 2005

O Beco de Baco

O Beco de Baco
José Correia Torres Neto

Estávamos todos no meio da rua, sentados ao redor de uma mesa de metal meio caindo-das-pernas em busca de um garçom para trazer-nos uma cerveja. Em nossa frente, um casal de quase namorados trocava beijos e abraços apertados. A boca vermelha daquela senhora se perdia entre o paladar do jovem rapaz, que se confundia entre filho e afilhado e, talvez, até neto.A cerveja surgiu em copos de requeijão e o seu sabor era tão diferente e especial quanto vinhos em copos de cristal. Uma quase-banda de frevo mostrava Alceu, Capiba e Osmar em uma só nota. A moça, de olhos negros ao lado e com um pássaro estampado nas ancas, flertava-me, enquanto abraçava distraídamente seu namorado.Os poetas, em suas loucas sanidades, deliravam seus pensamentos em um palco improvisado. Uma bicha louca, mais bicha do que louca, balançava seus quartos para outras bichas que iam e vinham e que também estavam com seus quartos a balançar. Tatuagens, olhares, sorrisos e tudo mais eram mostrados ao longo do beco. A lama ainda estava por vir em forma de chuva, poucos instantes depois; mas, antes disso, os catedráticos, filósofos, legisladores e intelectuais se misturavam aos bêbados, febris e folclóricas figuras (como um morador de cemitério chamado Alma Penada) que mostravam como se pratica o pensamento de Marx ou como se vivencia os sonhos de Poe.E lá estávamos nós, ainda no meio da rua, no meio do beco, no coração do nada...
Uma noite que não era noite. Uma imagem que não era imagem. Era um momento de sonho com relances de cômico pesadelo. A chuva caiu lentamente sobre as nossas cabeças. Todos corriam em busca de abrigo. A distância, que separava os filhos do beco, reduziu-se a quase nada. Aproveitaram todos. Tive beijo na nuca. Senti o perfume e o odor daquele beco em breves instantes e, de quase tudo, um pouco... Mãos atravessavam o meu corpo em busca de sei-lá-o-que e olhos, que se acompanhavam aos meus em busca do nada, perdiam-se sob a fria chuva e a fumaça dos cigarros...
Voltei pra casa sentindo na alma uma sensação meio difícil de explicar. Alegria, estranheza ou, quem sabe, até surpresa, por ter conhecido aquele metafísico espaço. Meus pés caminhavam entre a lama que vinha a se formar lentamente com a chuva.
Agora sim, o nome fez jus ao beco (ou foi o beco que fez jus ao nome?) - Beco da Lama. Deixei no beco uma parte de mim e levei algo daqueles que lá estavam...

por Alma do Beco | 12:28 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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Praieira
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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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mariza lourenço

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