segunda-feira, abril 11, 2005

SABE QUEM ESTÁ FALANDO?

Alexandro Gurgel

Léo e Mércia no Lorota's


Tem coisa mais chata do que atender ao telefone e, do outro lado, alguém dizer: sabe quem está falando? Saia justa! Se você conseguir reconhecer logo de cara, tudo bem. Se não, as velhas colocações:

— Ah! Quer dizer que não se lembra mais de mim, que eu não tenho importância para você? É assim, né? Passa um tempo sem falar comigo e já não me reconhece...

Outro dia, um velho amigo me ligou num sábado de ressaca, cedo. Ainda quase adormecido, atendi sem colocar os óculos para ver, no celular, quem estava do outro lado.

— Alô... – voz de sono.

— Amigo velho, como vai você?

— Eu vou bem. Quem está falando?

— Quer dizer que já não me conhece mais? Puxa vida, cara, nós estivemos sempre em contato, durante anos, quando trabalhamos juntos, e agora você não reconhece a minha voz? Que decepção!

Juro que intimei todos os meus neurônios em busca da identidade do meu amigo ofendido, mas não consegui descobrir. Terminei por optar por uma mentira:

— Não leve a mal. Acontece que depois que fiz 50 anos estou começando a ficar surdo e não consegui encontrar os óculos para ver a ligação, porque também estou começando a ver muito pouco... Desculpe-me.

— É fulano!

— Puxa! Eu bem que desconfiei, mas também achei sua voz parecida com aquele inimigo seu, e aí ficava chato correr o risco de errar. Você compreende, tenho certeza.

Daí por diante, o papo rolou normal, mas perdi momentos de constrangimentos. Logo eu, que quando ligo, digo logo que sou eu e vou direto ao assunto, porque tenho horror a telefone.

Depois que o papo terminou, eu resolvi contabilizar mais alguns minutos de sono a meu favor. Mas era o dia! Não demorou e o telefone toca novamente. Irritado, atendi, certo de que não me deixariam dormir mais naquela manhã:

— Alô?

— Como vai você, meu irmão?

— Eu vou bem, e você?

— Você não se lembra daquele meu problema?

— Posso até me lembrar se você me disser quem é.

— Não está reconhecendo a minha voz?

— Não!

— Mas homem, eu falo tanto com você! É Sicrano!

— Oh! Meu irmão, me desculpe — a essa altura, Charles Bronson perdia de mim no “Desejo de Matar”— é que sua voz está tão diferente, tão falseada, que eu não consegui reconhecer. Você está tomando algum remédio para a garganta?

— Por quê?

— A voz está fina, parece um travesti falando...

Ele desligou o telefone. Pelo barulho, deve ter quebrado o bicho.

Fui dormir de novo, vingado. Feliz. Mas acordei minutos depois com outra ligação. Dessa vez, de uma voz feminina, uma amiga que havia combinado uma programação para aquele dia:

— Alô?

— E aí?

— E aí, o quê?

Ela bateu o telefone na minha cara. A minha grossura havia ultrapassado os limites geográficos da ligação.


Leonardo Sodré

por Alma do Beco | 9:43 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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