Marco de Touros, hoje no Forte dos Reis Magos, Natal
A outra história
O Monte Pascoal seria o pico do Cabugi. O Brasil foi descoberto em Touros e não em Porto Seguro. A tese é defendida pelo professor e pesquisador Lenine Pinto
O Monte Pascoal na verdade é o Pico Cabugi, o Brasil foi descoberto em Touros e não em Porto Seguro e o marco de Touros na verdade foi chantado no dia 30 de abril de 1500, durante a segunda missa na Terra de Vera Cruz. A tese de que o Brasil nasceu aqui, no Rio Grande do Norte, defendida pelo pesquisador Lenine Pinto, 70 anos, demonstra uma série de dados a serem contestados na história oficial.
Quando estava pesquisando para seu livro Natal USA, lançado em 1965, descobriu um dado interessante: o comandante americano da força tarefa no Recife, na década de 40, Jonas Inghram, deixou escrito que escolheu Recife como base em função da proximidade com o Cabo de São Roque, que é o ponto mais estratégico no Atlântico Sul. Com relação a Salvador, ele diz que teria uma melhor base, mas a distância de 400 milhas a mais fazia uma grande diferença.
"Como é que estas 400 milhas não iam fazer diferença para naviozinhos a vela, cheios de gente e dependendo de vento?", indaga Lenine.
A partir de várias pistas levantadas numa pesquisa de quatro anos, já na década de 90, ele escreveu "Reinvenção do Descobrimento", publicado em 1998. Com a proximidade da data comemorativa dos 500 anos, o pesquisador foi muito procurado pela imprensa nacional. Sua tese vem ganhando adeptos pelo País. Hoje, ele já não se emociona quando descobre mais um dado que esclarece sua tese.
A última informação deste tipo foi a da caravela Boa Esperança que saiu de Portugal e está se dirigindo ao Brasil, refazendo o caminho de Cabral nas comemorações dos 500 anos. A embarcação teve de ligar os motores na travessia do Equador por falta de vento.
Segundo Lenine, Cabral também teve este problema. O navio estava praticamente parado. O tempo estimado da travessia de Cabo Verde ao porto seguro, onde ancorou Cabral, são 30 dias. Ele deve ter ficado um ou dois dias no mar, parado em função do desaparecimento da nau de Vasco de Ataíde. "Na realidade, ele fez a travessia em 28 ou 29 dias. Como é que ele poderia ter ido até o sul da Bahia?", adianta.
No ano seguinte, em 1501, João da Nova fez a travessia do Atlântico e levou 30 dias do Cabo Verde ao Cabo de São Roque, o que Lenine entende como mais um respaldo para o tempo da viagem feita por Cabral. "D. Manuel, numa carta enviada ao Rei da Espanha, explica que ele mandou João da Nova para procurar Cabral e eles já sabiam da rota. João da Nova não foi para o sul da Bahia e sim para as imediações do Cabo de São Roque", explica o pesquisador.
Lenine defende que os portugueses já haviam passado pela terra de Vera Cruz. Uma das provas é que a carta do rei D. Afonso V, datada de 1470, proíbe os comerciantes portugueses que negociavam na Guiné de explorar o pau-brasil. "Porque o pau-brasil? Não tinha o pau-brasil lá", questiona o pesquisador.
AGUADA — Em 1498, havia peste na ilha de Cabo Verde. O arquipélago estava seco e já se presenciava a seca provocadora do esgotamento de suas reservas hídricas. Este era o local para reabastecimento de água das embarcações. Vasco da Gama, lembra Lenine, passou por lá e também fez estas observações, depois de Cristovão Colombo. Nas instruções a Cabral, diziam que se ele tivesse água para mais quatro meses não era preciso parar em Cabo Verde.
A aguada - que era o sistema de abastecimento das naus, incluindo caça, a reposição de lenha dos navios e o descanso para os portugueses - aconteceu em Vera Cruz e não em Cabo Verde. "O ponto fundamental da carta de Caminha são as notícias das águas. Ele diz que as águas são muitas, encontraram lagoa de água doce e fala muito nos rios", menciona Lenine.
O pesquisador afirma que a água era tão importante que a naveta de mantimentos foi mandada de volta para Portugal com as notícias sobre este verdadeiro tesouro para a navegação portuguesa: a água. As coincidências históricas apontam mais uma questão que leva o descobrimento ao Rio Grande do Norte. O mapa de Cantino, em 1502, mostra que a ponta litoral do Estado era chamada de São Jorge, exatamente o santo do dia 22 de abril. Era praxe entre os navegantes batizar os achados como o nome do santo do dia.
MARCO DE TOUROS — Era normal chantar um marco no ponto onde chegavam e ao alcançarem o mar chantavam o segundo marco. "O Brasil tinha dois padrões (marcos): um em Touros e outro em Cananéia, em São Paulo", ressalta Lenine. Em documentos, há relatos de que Cabral percorreu duas mil milhas na costa brasileira. "Duas mil milhas é exatamente a distância entre a ponta do calcanhar (RN) e Cananéia", afirma.
Ele lembra que o marco de Touros foi chantado por Cabral, na segunda missa no Brasil, no dia 30 de abril, junto à cruz onde foi celebrado o rito católico e tomada a posse oficialmente da terra. Só o marco não foi suficiente para calçar a cruz e outras pedras semelhantes a ele foram colocadas junto. As pessoas imaginavam que todas as pedras eram marcos e chamaram uma das praias de Touros de praia dos Marcos.
Verbete 1 - Chantar, conforme o dicionário Aurélio, é fincar no chão, plantar de estaca. Significa também estabelecer-se, fixar-se.
Verbete 2 - A dispensa da tomada de água na ilha de Cabo Verde também contrariava a prática dos grandes navegadores como Bartolomeu Dias.
Tribuna do Norte, Cadernos Especiais