02/10/2004
Eduardo Alexandre de Amorim Garcia
Jornalista
Do alto do podium do Beco da Lama, Miguel Mossoró procura visualizar a ponte
que trouxe motivação à disputa eleitoral para prefeito de Natal na campanha de 2004
A insatisfação de um povo com seus governantes gera resultados imprevisíveis. A história da humanidade está cheia de exemplos. Foi assim na revolução francesa; foi assim no Fora Collor; pode ser aqui no 3 de outubro, com a chegada de Miguel Mossoró ao segundo turno.
O fenômeno Miguel Mossoró não aconteceu pelo simples fato de suas aparições na TV, no horário de propaganda eleitoral.
O desbotamento da bandeira vermelha do PT, hoje alçada à presidência da República, é fato notório, com a evasão de muitos dos seus quadros. Homens e mulheres que construíram a história do primeiro grande partido brasileiro nascido das classes trabalhadoras desiludidos com a falta de pulso do presidente diante do Fundo Monetário Internacional, que continua comandando a política econômica brasileira, tal qual comandou nos governos anteriores.
O voto da grande maioria dos petistas nacionalistas na eleição do atual presidente foi uma manifestação clara e direta contra o chamado neoliberalismo, prática que procura enfraquecer o poder do Estado, abrindo flanco maior para o desenvolvimento do capitalismo concentrador de renda, responsável pela fome e miséria espalhadas pelo mundo.
Lutar contra o neoliberalismo foi a grande bandeira de anos de luta do PT e de seu braço sindical organizado, concentrado na Central Única dos Trabalhadores, a CUT, convergência dos maiores e mais importantes organismos dos trabalhadores brasileiros.
Tinha-se a expectativa de que Lula, saído de uma consagradora vitória nas urnas, pudesse, com a esperança ressurgida nos corações brasileiros e populações socialistas espalhadas pelo mundo, fazer frente à política de desmonte do Estado, orquestrada pelo "Big Brother" nipo/euro/americano, esse ente abstrato que existe e governa o planeta.
Antes da posse, a decepção já era evidente. A capitulação de Lula e do PT diante do grande irmão já se tornara visível em sua primeira visita ao presidente Bush.
De lá para cá, um sucessivo jogo de cartas marcadas foi sendo imposto pelo FMI, Lula vendo-se obrigado a inclusive taxar pensionistas e aposentados, a mando do capitalismo internacional.
A decepção foi roxa.
No plano local, municipal, o prefeito que hoje governa não foi eleito pelo povo. É um vice no exercício do mandato, longe de obter a simpatia e o arrojo eleitoral que sempre caracterizaram sua madrinha na Prefeitura, a governadora Wilma de Farias.
Carlos Eduardo, jovem prefeito de Natal, não é homem que atraia para si tanta antipatia. Mas é o candidato do governo e contra candidato do governo sempre surge uma candidatura de oposição.
Aberta a campanha eleitoral, Luís Almir disparou como adversário de Carlos Eduardo, deixando para trás nas pesquisas a candidata que, antes oposição, hoje representa o situacionismo do governo federal, sem conseguir atrair para si a simpatia do eleitorado desejoso de mudança.
Natal, em sua história, tem dado demonstrações de muita maturidade em suas lutas. Aqui, nasceu André de Albuquerque, Padre Miguelinho; instalou-se um governo comunista; um líder trabalhista fez-se presidente; um governo revolucionário de grande gosto popular foi empreendido com Djalma Maranhão.
Sem que Fátima conseguisse imprimir a sua campanha a característica de enfrentamento que levasse a resultados, a oposição da cidade que nunca assemelhou-se ideologicamente à uma política tipo Luís Almir, viu-se, de cara, fora da disputa, sem chances de brigar pelo Palácio Felipe Camarão.
Uma campanha que parecia sem atrativos e que já se conhecia seu vencedor.
Até que surge Miguel Mossoró falando mal do turismo predatório, hoje uma realidade na nossa capital, que não deixa mais suas jovens filhas passear pelas praias urbanas, e começa a ganhar o apoio da classe cara-pintada estudantil por tiradas de hilaridade e confrontação com a política tradicional que, no governo, pouco faz e; nas campanhas, tudo promete.
Miguel Mossoró surge desse hiato de possibilidade de uma contraposição ao governo de Carlos Eduardo e da insatisfação do povo com o governo federal, que prometeu dar emprego ao povo e que só mais tributo criou para mais penalizá-lo.
Com seu jeito simples, brincalhão, humilde mas cheio de criatividade e carisma, Miguel Mossoró, com sua fina ironia, fez o povo de Natal voltar a sonhar.
E suas idéias mirabolantes ganharam as ruas e o seu carisma chegou ao povo, que passou a vê-lo como possibilidade de dar um troco real à insatisfação reinante.
Hoje, Miguel cresce e deverá chegar ao segundo turno, desbancando grandes lideranças políticas do Estado.
Se o segundo turno para Miguel se concretizar, saiam da frente, porque Mossoró vai governar Natal.