Alex Medeiros
O Jornal de Hoje
16.02.05
A esquerda foi quem começou a considerar as elites um mal para o País. Dos anos 60 para cá, virou moda atribuir a elas todas as desgraças em solo pátrio. Bater nas elites, mesmo sem saber identificá-las, transformou-se em figura de linguagem dos políticos de esquerda ou de direita, assim como o termo "com certeza" incorporou-se ao parco vocabulário de celebridades e novos ricos. Nos dois casos, servem como máscaras a tentar esconder visível ignorância.
Nos países avançados, elite é tudo aquilo que está na ponta da corrida do desenvolvimento, a lanterna que alumia os caminhos da patuléia que segue atrás. O habitat natural das elites se encontra em terrenos férteis de universidades e instituições políticas, dois locais que no Brasil perderam ciência e se contaminaram com o empirismo (leiam o artigo de segunda-feira), terrenos ricos onde cresceu o lodo da ignorância. No primeiro, o símbolo de avanço é Lula e suas cotas no vestibular; no segundo, a referência maior passa a ser Severino Cavalcanti.
O novo presidente da Câmara, que surrou o governo do PT numa eleição histórica, é o efeito "Miguel Mossoró" em âmbito nacional, como lembrou ontem o concluinte de Direito, Rodrigo Levino, via e-mail. A semelhança eleitoral existe, mas nosso Miguel pelo menos é um gozador e está longe do atraso moral e do fundamentalismo católico do pernambucano do baixo clero. Mas a eleição de Severino enriquece a cenografia de ópera bufa do Brasil-espetáculo, pátria de socialites incultas, o "País do Big Brother", a "Nação do Operário Potrão".
Mas Severino Cavalcanti não está tão longe assim dos seus concorrentes no quesito "espírito público". Tanto o derrotado Greenhalgh, quanto o rebelde Virgílio também defenderam aumento das mordomias parlamentares. E nessa onda nepotista, a classe política não surfa sozinha. O respeitável ministro Nelson Jobim, falastrão de carteirinha, é um dos primeiros que rezam no "venha a nós o nosso reino e seja feita a nossa vontade".
Esquerda e direita, com a fidelíssima ajuda da mídia fútil, nas últimas duas décadas "severinaram" o Brasil. O que é na presente legislatura a representação política e cultural na Câmara de Vereadores de Natal, senão um surto de "severinização"? Vivemos o day after da virose "lulista" que nos quebrou a eficiência imunológica contra o atraso. Mas o discurso oco contra as "elites" nunca identificadas cai como uma luva na retórica idiota das lideranças devassas, da imprensa ululante (como diz Neumanne Pinto) e das autoridades amorais.
O Brasil precisa é recompor a elite, escapar das ideologias da miséria, tirar de seus professores e cidadãos de nível superior a condição financeira proletária. Desinverter os papéis, onde quem pensa com dignidade conta nos dedos a cesta básica da semana, enquanto num plenário imbecil uma besta eleita roda nos dedos a chave da Pajero que lhe leva até o banco mais próximo, onde está bem escondido o seu "pão nosso" amassado pelos diabos da hipocrisia "democrática".Festejem, vibrem, regozijem. O Brasil derrotou as elites e segue célere no rumo do desenvolvimento, estamos conquistando o planeta com meia-dúzia de campanhas publicitárias medíocres para programas de governo idem. Atingimos a redenção do sofrido povo nordestino, temos um pernambucano no Planalto, outro na Câmara, um alagoano no Senado, um baiano com a chibata da Cultura e centenas de colunistas nadando na transposição do vernáculo. Que o mundo assista, ao vivo, a primeira conversa entre Lula e Severino, resgatando antigo prefixo: Pernambuco falando, besteiras, para o mundo.