terça-feira, fevereiro 01, 2005

Centeio e sonho


Centeio e sonho

O mundo seria outro se cada um conhecesse o seu espelho. Se a ele mirasse sem as máscaras das manhãs, lavado o rosto de sonhos banhados em ego.

As relações decerto seriam outras.

A imagem não esconderia falsidades nem hipocrisias. Não acataria as pedras atiradas aos pecados santos de quem pior nunca foi; não se deixaria dourar, pobre alma de latão, ali, diante de si.

O lado não virtual do espelho não se pergunta: que fiz de mim ou o que fui? O que fiz, o que deixei? Não se indaga. O essencial não importa, mas as mentiras refletidas.

Seu lado não virtual afoga-se em maquiagem perfeita de si mesmo.

Nunca duvida: sou o cara. Presa ao suporte, sua imagem ri da cena. Abomina, mas aceita. Como fugir?

Nem as marcas dos anos modificam o cotidiano encardido que ficou. Um dia a mais; a menos, nada modifica o transmutar das horas.

O eu virtual tem limites. O que está diante de si, talvez nunca: é a máscara do império quase sempre estampada; é o senhor de todos os atos humanos e sublimes a mirar-se diante do que nada vale. Porque o que vale, o que é e será, é ele: o senhor das horas absolutas e sem pecados, puro, imaculado, a desdenhar da realidade em volta. Dos amigos, das situações, até dos perigos que não chega a ver diante de si.

Os homens de caras lavadas diante dos espelhos são deuses. Perfeitos, não enxergam. Só os mortais da vizinhança não sabem vê-los assim: esses não prestam.

Os homens diante do espelho navegam na ambigüidade de si mesmos. Não se sabem joio: sonham-se trigo.

Jamais amassarão o pão do centeio consumido. Consomem. Consomem-se.

E ainda se acham melhores do que os que derramam o suor gestor de sua vã egolatria.

Neuza Margarida Nunes

Barro Vermelho, Natal/RN, 1 de fevereiro de 2005

Analisando o gás da maldade

por Alma do Beco | 5:38 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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(Serenata do Pescador)


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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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