A bela Su Sodré e o chato Dunga
A cidade estava que era um marasmo só. Nesse ano, nem comemoração ao Dia da Poesia houve. Com o intuito de manter a brincadeira, não deixar a peteca cair, os sebistas resolveram provocar fazendo uma lista dos chatos natalenses.
Tinha chato reitor, chato irmão, chato performático, chato jornalista, chato advogado, tinha chato para todos os gostos a lista da moçada: setenta, ao todo. Muito chato para uma chata cidade só.
Chatos poetas eram dois, que poesia que se preza merece reconhecimento dobrado. O chato Dunga e o chato Astral. Eduardo Alexandre e Carlos Frederico, respectivamente.
Eduardo ficou inconformado.
— Eduardo Alexandre até que vai. Esse é chato mesmo. Mas Dunga, e logo ao lado de Astral? É muito chata essa posição, me poupem! Reclamava indignado o poeta, há muito tempo afastado do movimento artístico, decepcionado que estava com a política cultural da província.
Carlos Frederico, no entanto, exultava. Finalmente fora reconhecido na condição de poeta, e, para ele, apesar da condição de chato, ser considerado poeta era o máximo. Afinal, todos, insistentemente lhe negavam o valor dos seus versos. Era tanto o seu contentamento que foi tirar Eduardo do seu recolhimento.
— Você viu, poeta, saiu no jornal o meu e o seu nome na lista de chatos da cidade?! Chatos poetas. O que é que você acha?
— Eu acharia melhor se só saísse um nome nessa lista, Astral. Respondeu-lhe Eduardo, visivelmente consternado. Você bem que poderia ficar com a exclusividade da honraria.
Satisfeito com a recusa, Carlos Frederico correu aos sebos para contar a novidade.
— Se Eduardo não aceita, então fico sozinho na lista. Argumentou, convicto de que a idéia seria bem aceita pelos promotores da brincadeira. Até que alguém explicou:
— Astral, você é tão chato que tinha mesmo era que figurar na nossa relação. Só não sabíamos em que tipo de chato a gente lhe enquadrava. Colocamos como poeta porque todo mundo em Natal é poeta, até você, mas se a lista já não tivesse sido impressa, até que poderíamos ter reservado para você o título de chato chato, mas esse já é de Carlos Gurgel. Que tal chato de galocha, que ainda não tem?
Astral saiu revoltado da conversa. O chato não lhe agradava, é bem verdade, mas perder o reconhecimento de ser poeta, isso nunca, desabafou no bar do Nazi, depois de três doses de cana.
— Chato poeta até que vai. Mas chato de galocha? Será que eu não sou poeta, poeta?
E tomou todas, receoso de ser excluído da lista.
Edgar Allan Pôla