domingo, março 20, 2005

Mundo de poesia

Alexandro Gurgel
Alexandro Gurgel
Poeta Helmut Cândido

FRANCISCO BANDEIRA DE MELLO

Sempre sonhei, quanto à literatura, literalmente, um mundo em que toda pessoa fosse amásia de poesia. E em que quase todas as pessoas cometessem os seus poemas - frutificassem um pomar de poemas - na mesma viciosa e inocente atenção (às vezes intensa) com que ouvem/vêem novelas, fumam cigarros, lêem revistas e jornais (às vezes livros), jogam dama ou dominó (às vezes xadrez) e vão ao futebol. Poesia de quase todos, poesia para todos. Sem qualquer excesso de fronteiras ou besteiras. Poesia de dentistas, médicos, jornalistas, soldados, padeiros, farmacêuticos (por que não?), flautistas, advogados, pintores, agrônomos, deputados, vereadores etc. Claro que, sobretudo, pois mais verdadeiras, poesias de poetas profusamente/profundamente literatos, usando as musas com lirismo e racionalismo. Sempre desejei um mundo cheio de quadrinhas (e não apenas de quadrinhos), sonetos, haicais, elegias, baladas, odes, epigramas, sextilhas, galopes a beira mar, ditirambos, redondilhas, repentes, versos livres etc. (Quem apoia a liberdade, deseja também o verso livre). Aprecio espectralmente todos os poemas, com ou sem rimas e com bons rumos. Verto-me, portanto, àquela vertente que vê o poeta desmitificado. E, o fazer poético, uma coisa peculiar/familiar. Não como varrer a casa ou escovar os dentes, mas como uma coisa que esteja sempre na ponta da língua (na conta do cérebro). Que esteja bem treinado liricamente e literariamente. Sempre com uma linguagem de sonho e uma precisão matemática. Num jogo de imagens, com flores e frutos na linguagem. Sempre me interesso por um amor ao pomar de poemas. Que alimente a alma de todos os cidadãos do mundo. Seja um “monumento do instante”, como um soneto de Carlos Pena Filho, ou uma “vertigem lúcida”, seja uma constante monumental como “Os Lusíadas” de Camões, uma “Educação pela Pedra” ou “Uma Faca Só Lâmina” de João Cabral, ou “O Fazendeiro do Ar” de Carlos Drummond etc. Essas considerações nasceram a propósito de um livro para o qual me foi solicitada uma apresentação. Na verdade, as apresentações cooperam na boa leitura do livro - cujo interesse maior, claro, é o seu texto, que vale ou desvale por si mesmo. Embora os elogios lhe promovam e as boas explicações lhe esclareçam. É claro. Achar que o livro precisa de apresentação, contudo, é uma prova de humildade que dá simpaticamente esse ou aquele escritor. Terá raciocinado o autor: -Se o meu livro for bom resistirá a qualquer tipo de mau apresentador e de crítica contrária, mas terá, claro, um impulso positivo com uma boa apresentação e uma crítica favorável. Quanto a mim, como leitor, tenho me exercitado quase apenas, nos últimos anos, pela poesia que incorpore o aparato técnico/racionalizador disponível em nosso tempo - modernista e pós-modernista. Uma poesia de vanguarda (não de vã-guarda). Que tenha sempre um jeito de primeira, algo de primeva (não primitiva), um tanto primaveril, romântica, concreta, experimental. Como já disse várias vezes: embora aprecie poesia de todos os tipos, estou mais ligado a uma poesia de protótipos. Ou seja desse ou daquele tipo, mas embelezada de bons tópicos, dessa ou daquela escola, mas numa boa escala, com belo estilo. Que seja bem inserida e não enxerida num contexto, realista ou surrealista, numa técnica parnasiana, romântica, impressionista, modernista etc. (Seja a poesia que se improvise ou, melhor, a de laboratório mental). Chegar à poesia com o anelo de quem está com fome e exigir cada vez o melhor do seu cardápio. Numa bela versatilidade da linguagem. Pois poesia não é só o que está escrito em versos, é o que é substancialmente poético. Em suma, o bom autor é uma pessoa inteligente, racional (não apenas animal) e sim versátil (sem trocadilho) e muito bem aprofundado nos seus versos. Impulsionado na literatura - ler muito e escrever, na verdade, “escreviver”. E assim poderá se sobressair entre esses milhões de poetas que desejo para o mundo. Literatura, concluo com José Lins do Rego, encarada “como coisa substancial à vida e essencial para a grandeza do homem”. Por certo a poesia, quando verdadeira, atua diretamente sobre a linguagem e é através dela, portanto, que os homens se acrescentam ou alicerçam - “poesia, fundação do ser mediante a palavra”/Heidegger.



Jornal do Commercio, Recife, 20/03/2005.

Francisco Bandeira de Mello, jornalista, é da Academia Pernambucana de Letras.

por Alma do Beco | 3:33 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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