segunda-feira, março 07, 2005

Das farpas ao fogão

João Maria Alves
João Maria Alves
Entrevista... FRANKLIN JORGE
O Jornal de Hoje, 07/03/05

Marcílio Amorim
Repórter

Quem vê de longe pensa até que ele é inofensivo. Pequeno, franzino e de voz doce, o escritor e jornalista Franklin Jorge arde que nem a pimenta que tempera os seus pratos de restauranter. Mas faz protesto em voz baixa. Com 40 livros inéditos na gaveta, ele tem se distanciado um pouco da rotina da classe artística e intelectual da cidade para receber as pessoas em sua própria casa e se dedicar a uma de suas paixões: a culinária. Franklin acaba de inaugurar um café em Capim Macio, onde abre espaço para a cultura e prepara receitas herdadas de seus antepassados. Dono de uma indignação nata, sem papas na língua, ele não é homem de recuar. No início da entrevista exclusiva ao Diversão & Arte ainda resistiu um pouco. "Eu não queria mais polemizar, ando atendendo o desejo do cliente". Mas, diante do primeiro questionamento, ele disparou-se a falar e "polemizar", claro! Confira.

O Jornal de Hoje - A cultura potiguar está indo bem?
Franklin Jorge - Hoje em dia não, e nas últimas três décadas a coisa vem se agravando. A cultura está entregue aos cartolas, quem cria está aleijado nesse processo. Natal carece da cultural verdadeira, porque depois que os políticos descobriram que a cultura é charmosa expulsaram os verdadeiros criadores e tomaram seus lugares. Com exceção do movimento musical, que em Natal é histórico e dispõe de alternativas de espaços para fluir. Todas as outras produções artísticas da capital estão estagnadas.


JH - Você tem circulado nos eventos culturais?
FJ - Não, porque eu não quero mais perder meu tempo. Mantenho um contato com as pessoas amigas. Mas nada cerimônias oficiais, é sempre uma repetição.

JH - Mas onde estão os erros?
FJ - Não reconheço competência nos dirigentes da nossa arte para implementar uma política cultural séria. As iniciativas significativas e que realmente chamam atenção para a arte potiguar são independentes ou privadas, como é o caso da Casa da Ribeira. O governo tem obrigação de dar condições para o fomento da cultura, mas aqui, ao contrário do que acontece nos outros estados, o Estado concorre com os artistas.

JH - Como assim?
FJ - Estabelecendo programações e incentivando projetos que consomem recursos e não atendem aos interesses da cultura. O Estado tem que criar público, como fazia Jesiel (Figueiredo) nos 10 anos em que ficou a frente de um teatro. É um absurdo o governo e a prefeitura investirem rios de dinheiro em eventos auto-sustentáveis, como é o caso do Carnatal, que não deixa nem poeira para a nossa cultura.

JH - Você foi uma das pessoas mais revoltadas com a reforma do Teatro Alberto Maranhão. A raiva passou?
FJ - Muitas pessoas caracterizam minhas palavras como raiva, mas na verdade é desgosto por ver o patrimônio público sendo descaracterizado e mal digerido. A idéia de transformar o Salão Nobre do TAM em mausoléu de Alberto Maranhão também é uma das coisas mais absurdas que já se viu e com certeza será motivo de risos para todo o Brasil. Restos mortais devem ir para um cemitério e não para um teatro.

JH - Se você fosse convidado a comandar uma instituição cultural, aceitaria?
FJ - Não, as instituições estão apinhadas de apadrinhamentos políticos. Eu só iria me desmoralizar, como aconteceu com Ives Bezerra, uma pessoa capaz que se desmoralizou no gerenciamento da saúde do atual governo. Confesso que houve um tempo em que desejei ocupar um cargo público, foi em 1988, quando Garibaldi criou a Secretaria de Cultura. Acreditava que assumindo a direção de uma instituição recém criada, teria condições de criar uma política séria para a cidade. A secretaria foi entregue a um arrevista, sem nenhum trato e nenhuma relação com a cultura. Isso tem se repetido ao longo dos anos, principalmente no governo Wilma e na prefeitura de Carlos Eduardo, que até cheguei a acreditar que seria algo novo para Natal.

JH - Você tem acompanhado a evolução da cultura no interior do Estado?
FJ - Acredito que a cultura se deslocou para o interior. Não tenho receio em afirmar que Mossoró é a capital cultural do Rio Grande do Norte, com um trabalho que remonta 40 anos atrás. Tenho 52 anos e ainda garoto, no início da minha adolescência, freqüentava Mossoró nos finais de semana para assistir os espetáculos do TEAM (Teatro Escola de Amadores de Mossoró).

JH - O que acha das Casas de Cultura do interior do RN?
FJ - A idéia é excelente, mas está funcionando? Até onde eu sei a de Assu está fechada e a de Macau virou um bar. É a cultura desvirtuada em nome do poder.

JH - Atualmente você tem se dedicado, quase que integralmente, a culinária. Como surgiu a paixão?
FJ - Cozinho desde menino. Lá na fazenda eu escolhia e cozinhava o cardápio de sábado. A minha família tem o cultivo de comer bem e sempre fizeram a comida. Herdei um caderno de receitas de minha avó, que está na família tem quase 200 anos, oriundo de Portugal.

JH - Mas cozinhar para a família é diferente de cozinhar para o público?
FJ - Sempre criei pratos e cozinhei para meus amigos. Tenho um livro inédito só sobre culinária (À Mesa com o Senhor Vatel - Cozinha Sofisticada Para Solteiros), com prefácio do poeta Thiago Melo.

JH - Quais são os destaques do cardápio?
FJ - O Café se chama "Estação Natal", foi inaugurado na última quinta-feira e funcionará de quarta-feira a sábado, das 16h às 22h. O cardápio é bem diversificado. Eu fundi a gastronomia de várias culturas e tenho como peças destaque o "Keshi Yená" (Queijo Recheado), um prato caribenho criado na época do descobrimento por piratas holandeses, é o prato nacional de Curaçao. Tive acesso quando morava em Rondônia e viajava com o governador, para fins de semana no Caribe. Nos doces é a torta de berinjela, com recheio de frutas cristalizadas e cobertura de chocolate. Outro sucesso é a "Schioccata", pizza crocante sem recheio (com queijo e molho). Além disso também damos espaço para a cultura, estamos com a exposição de J. Medeiros, que é o curador do espaço e também teremos saraus, lançamentos literários e happy hour com um tom mais intimista. Trabalhamos com o conceito de atelier gastronômico, tudo pode ser comprado.

JH - A fama de briguento/polêmico incomoda?
FJ - Incomoda sim, por ser uma maneira que os meus desafetos têm de me desacreditar. Quem me conhece sabe. Contudo a polêmica está na essência da cultura. Sem polêmica não existe fomento de idéias. O que caracteriza o intelectual sério é a capacidade de questionar o "status quo", o estabelecido.

por Alma do Beco | 9:25 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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