domingo, julho 24, 2005

QUEM TEM BOM NÃO GRITA




Bobagem. Melhor falar do que fazer. Pior, no entanto, é fazê-la falando. Assim como quem, na linha do “estou nem aí”, prefere atribuir a Deus as próprias culpas. Afinal, segundo discurso que Lula pronunciou em Recife, ''Deus não faz nada que não seja preciso''. Melhor dizendo, tudo que Deus faz é preciso.

Deus fez o mundo. Era preciso. A luz, o firmamento, a água. Era preciso. As plantas, os astros, os peixes e os animais. Era preciso. Deus fez o homem. Teria sido preciso? Ora, a luz ilumina; o firmamento sustenta os astros; a água forma mares e rios. As plantas dão sombra e frutos; os astros dão noite e dia; os animais e os peixes dão carne e sustento. A atividade que todos eles desenvolvem não causa precisão. Pelo contrário. O homem, no entanto, esse apenas reina e governa. E, além disso, precisa.

Precisa da luz, do firmamento, da água. Precisa dos astros, dos peixes e dos animais. Precisa até dele próprio. Quem duvidar, olhe em torno. Ouça em torno. O homem-delúbio se dizendo providência. E afirmando ter sido preciso tudo o que ele fez. Só que o que ele fez não foi preciso. Faltou precisão no que ele fez.

Ele foi impreciso, o homem-delúbio, quando tentou enganar o homem-jefferson. E pretendeu se tornar o lobo do lobo, esquecendo-se das experiências por este vividas na taberna política de sua propriedade, tal qual um Sparafucile, personagem verdiano cuja habilidade maior consiste em saber vender os atrativos de Madalena, sua irmã. Ele foi impreciso, o homem-delúbio, quando deixou o número de seu celular com a mulher-karina, que, por ser “carina”, ele julgava “mobile”. Móbile, que eu saiba, é aquela dona, irmã do Sparafucile, fazedora de salão em casas alegres. Por último, não por derradeiro, ele foi impreciso, o homem-delúbio, quando acreditou que todos os personagens de Verdi se chamam Rigoletto e são bobos na Corte.

Na Corte nem todos são bobos. Há muitos condes e condessas, muitas damas e pajens, muitas aias e lacaios. Isso é certo. Há também homens honestos e trabalhadores, mulheres que são e parecem ser sérias, mantovanos comuns, como convém a todo reino. E sobre as pontes do reino os mantovanos cantam e dançam. Sem precisão de convites e vestimentas a caráter. Diverte-se também o rei, que ninguém é de ferro.

A gente comum sabe que o caráter dos costumes endossados por um grupo de nobres formadores da Corte é impresso por uma estrelinha vermelha pendurada em golas e lapelas. Não pode, entretanto, afirmar com toda convicção tenha essa estrela-ornamento impresso caráter na alma de quem a usa. E um dos que usam a tal estrela é o próprio Rei (em versão teatral, com Victor Hugo), o Duque de Mântua (em versão operística, com Giuseppe Verdi).

Sobre tal figura, bom escutar a versão de seu criador. E ninguém traduza o termo criador pelo próprio personativo Duda Mendonça. Estou falando do sempre lembrado Verdi. Para ele “o Duque tem um caráter nulo e deve ser um libertino; não é, porém, repelente". A não ser que alguém o veja como um sapo barbudo.

Quanto ao seu caráter, de esquecê-lo por enquanto. Inesquecível, contudo, é o tema da libertinagem. Isto é, o tema da liberdade de costumes. Costumes políticos. Costumes administrativos. Costumes livres, como aqueles praticados nos lupanares.

Por lupanar cabe entender, na lição do poeta, “uma camada de dinheiro que cobre a Terra em fina camada que a idéia não vê e o homem não se importa”. Quer dizer, não se importa o homem-homem, porque o homem-valério se importa. E muito. Assim como o homem-delúbio e, por extensão, o homem-dirceu. Tantos homens, que chego a imaginar se muitos outros também não são “habitués” do “bas fond”. A começar pelo Duque, um Rei que se diverte?

Tipo divertido, o Rei fez um banquete. E no banquete, um novo discurso. O engraçado no novo discurso do Rei é uma espécie de aliteração que ele contém. Repetitivo, o Rei insiste em se indiciar o mais ético e o mais honesto dentre todos os mantovanos, sejam nobres, plebeus ou integrantes do clero. “Nesse país de 180 milhões de habitantes pode ter igual, mas não tem mulher nem homem que tenha coragem de me dar lição de ética, de moral e de honestidade", teria dito.

Mais uma tolice do Rei. Dita e feita. Coisa de Papangu, valendo-me do regionalismo. E olhe que estou me situando em um ponto de vista simplesmente mercadológico. Afinal, quando menino, freqüentador, pela mão do pai, de feiras livres, escutei uma verdade propagandística que tenho por imorredoura. Verdade comunicada sob a forma de pregão. Um feirante, desses encontráveis em qualquer reino, me ensinou antiga lição: quem tem bom não grita. E tão fundamente gravei essa verdade que hoje chego a temer pelo Rei. Se continuar assim apregoando seus dotes de caráter, vão pensar ser ele um bufão.


Taumaturgo Rocha

por Alma do Beco | 10:09 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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