Nei Leandro de Castro
João Pessoa, Princesa Isabel
e Rio Branco se juntavam ali,
como todo mundo,
pra falar mal da vida alheia.
- Fulano deu pra fulano.
- Essa aí dá muito mais
do que paca de mão branca
em noite de lua cheia.
- Sabe quem anda chupando?
- Beltrano é corno e não sabe.
- Ora não sabe. Ele gosta.
- O Doutor deu um desfalque
e fugiu com a amante.
Indiferente aos murmúrios,
o menino roubava chocolates
da confeitaria antiga,
espiava os sorvetes
exibidos na Cruzeiro,
tomava carapinhada,
torcia pelo América
via os matinês do Rex,
tentava pegar nos peitos
da primeira namorada,
sonhava ganhar dinheiro
e comprar todos os sonhos
de valsa que ele roubava.
Um dia o adolescente
quase morre ledamente
afogado num pileque
monumental no Bar Cisne,
O cafezinho ao lado
às vezes queimava a língua
de quem falava demais.
Os copos de Cuba Libre
se levantavam no ar
contra a invasão dos marines.
Os políticos da província
do alto dos seus palanques
prometiam tudo, até
a independência do Reino
Unido do Grande do Ponto.
Às onze horas da noite
João Pessoa, Princesa Isabel
E Rio Branco trocavam
um cordial boa-noite
e prometiam voltar
na manhã do outro dia
a falar da vida alheia.
In Poesia Viva de Natal, Manoel Onofre Jr.
Fundação Capitania das Artes/Nordeste Editora, 1999